São Paulo, domingo, 01 de maio de 2011

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Após incêndio, "some" a ajuda para favelas

Moradores nas comunidades afetadas dizem aguardar auxílio da prefeitura para conseguir alugar casa nova

Prefeitura de São Paulo relata casos de recusa de auxílio; moradores negam e dizem que continuam esperando

RODOLFO BLANCATO
EDUARDO PASCHOAL DE SOUSA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Há cerca de um ano, a empregada doméstica Arlenice Gomes, 40, ocupou uma área da favela da Tribo, zona norte de São Paulo, fugindo do aluguel que consumia R$ 250 -metade de sua renda. Em novembro de 2010, um incêndio atingiu sua casa e a de outras 14 famílias.
Até hoje, eles esperam o auxílio da prefeitura para alugar uma nova moradia.
Nesses casos, os moradores têm direito a "aluguel social", um auxílio em dinheiro que varia de R$ 300 a R$ 400.
Histórias assim são comuns na cidade de São Paulo. Em 2010, o Corpo de Bombeiros registrou 117 incêndios em favelas da cidade, número um pouco abaixo da média dos cinco anos anteriores- 136 casos por ano.
Os desabrigados da favela da Tribo receberam colchões, cobertores e cestas básicas, padrão em emergências desse tipo, e a oferta de um abrigo temporário, mas recusaram. Eles ainda esperam pelo auxílio-aluguel.
O grupo teve duas reuniões com funcionários municipais, mas suas reivindicações não foram atendidas.
Segundo a Sehab (Secretaria de Habitação), caberia ao Cras fazer o levantamento das famílias que precisariam de atendimento prioritário. A pasta, porém, diz ainda não ter recebido as informações.
As famílias contaram apenas com a solidariedade dos moradores da região, que fizeram doações de roupas, móveis e eletrodomésticos.
Casas desocupadas na favela foram cedidas pelos donos e desde então servem de abrigo para a maioria dos atingidos. Alguns deles já falam em construir novos barracos por ali mesmo.

PROMESSAS
Na Favela Salus, na zona norte, a ajuda também se resumiu a doações emergenciais após um incêndio em setembro do ano passado.
O fogo destruiu dezenas de barracos, inclusive o da dona de casa Talita Rocha, 25, que voltava para casa após o parto da primeira filha.
Funcionários da Prefeitura de São Paulo chegaram ao local após o incêndio e prometeram ajudá-los a conseguir uma nova moradia. A promessa nunca foi cumprida e Talita foi morar na rua, com o marido e a recém-nascida.
Foram dois meses vivendo como desabrigados até serem acolhidos na casa de alguns parentes.
Os moradores da Salus contam que, durante o cadastramento, funcionários da prefeitura prometeram ajuda, mas nunca os procuraram depois disso.
O supervisor de habitação da Subprefeitura da Vila Maria, José Rodrigues, diz que os moradores se recusaram a ir para abrigos públicos e que só poderia encaminhá-los para atendimento se deixassem a favela. Talita nega ter recusado o auxílio.

VISIBILIDADE
O incêndio na Favela do Boqueirão, na zona sul, aconteceu em fevereiro desse ano. Apenas a casa da empregada doméstica Conceição de Oliveira, 64, foi atingida. Mesmo assim, a ajuda nunca chegou.
O fogo destruiu quase tudo da família. Adriana Honorato, filha de Conceição, conta que funcionários da prefeitura visitaram o local no mesmo dia e fizeram a doação emergencial de colchões, cobertores e cestas básicas-como de costume.
A única diferença para os outros casos foi a promessa dos funcionários de entregar madeira para que a família pudesse reerguer a casa.
Duas semanas depois, a obra já estava quase pronta, graças à ajuda dos vizinhos, mas nenhuma das tábuas havia sido entregue.
A respeito do incêndio na favela do Boqueirão, a Sehab informa que não recebeu nenhum tipo de solicitação de atendimento habitacional.
Segundo a Subprefeitura do Ipiranga, responsável pela região, não há registro de pedidos feitos ao órgão pelos moradores atingidos.
Em outras três favelas visitadas pela reportagem- Real Parque e Rocinha, na zona sul, e Ponta da Praia, na zona oeste-, os atingidos estão recebendo o aluguel social e a Sehab garante que receberão moradias definitivas.
Para o advogado Carlos Loureiro, do Núcleo de Habitação e Urbanismo da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, o poder público concentra sua atuação nas comunidades com mais visibilidade, localizadas em regiões mais valorizadas.
"Favelas que não têm tanta exposição, que não ganham as páginas do jornal, dependem muito da mobilização popular", afirma.

EDUARDO PASCHOAL DE SOUSA e RODOLFO BLANCATO são alunos do curso de jornalismo, na ECA-USP e e ganhadores do 2º Prêmio Jovem Jornalista Fernando Pacheco Jordão, promovido pelo Instituto Vladimir Herzog.


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