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Cidade tenta unir pais e filhos com fotos
Imagens e vozes gravadas evitam que crianças se esqueçam de agricultores que ficam 8 meses longe de casa
VERIDIANA SEDEH
ENVIADA ESPECIAL A ARAÇUAÍ (MG)
O marido de Maílsa Fernandes, 22, não acompanhou a gestação da filha, Júlia, hoje com
sete meses. Provavelmente não
verá seus primeiros passos. Ele
foi para o corte de cana quando
Maílsa estava no primeiro mês
de gravidez e só voltou uma semana antes do parto. Em junho, retornou ao canavial.
Assim como ele, 2.000 homens deixaram Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha (MG), neste ano rumo a usinas de cana-de-açúcar em São Paulo, segundo dados do Sine (Sistema Nacional de Empregos).
Mesmo sem incluir trabalhos
clandestinos ou em outros Estados, essa cifra já corresponde
a cerca de 20% dos homens
com mais de 18 anos -idade
mínima para as usinas-, segundo dados da ONU de 2000.
O próprio Sine admite que o
número deve ser bem maior.
Quando voltam, após oito
meses, esses pais já foram esquecidos pelos filhos. Para
manter o vínculo das famílias, a
americana Emma Raynes, 25,
envia, há um mês, fotografias
das crianças para plantações de
cana. Com isso, ela espera que
os pais acompanhem, de longe,
o desenvolvimento dos filhos.
O trabalho também é feito
com quem fica. Desde fevereiro, Emma fotografa famílias e
grava mensagens de pais em
CD para que as crianças mantenham contato com a figura paterna. "Vou mostrar sempre a
foto do pai para que ela não se
esqueça dele", diz Maílsa.
Para fazer o trabalho, Emma
recebe apoio de uma fundação
holandesa, que também financia um projeto da ONG CPCD
(Centro Popular de Cultura e
Desenvolvimento) com grávidas e filhos de cortadores.
Sair de casa rumo aos canaviais é destino também dos jovens de Araçuaí. Eles anseiam
pela maioridade por acreditarem que o trabalho nas usinas
seja um dos únicos meios de adquirir bens. "Meu filho de 15 fala que está doido para completar 18 anos para ir para o corte",
diz Valdenice Maria Alves, 35.
Ângela Maria Moreira, 46,
diz que um de seus cinco filhos
afirma: "Você não tem condições de dar o que eu quero. Até
comida, às vezes, você não pode
dar". O produto mais cobiçado
hoje em Araçuaí é a moto.
"De uns cinco anos para cá,
virou uma febre. Primeiro foi o
relógio, depois, o som. Agora é a
tal da motocicleta", relata Celso
Silva, 47, que já foi cortador de
cana e trabalhou na Secretaria
Municipal de Agricultura.
Pela falta de oportunidades
de emprego, alguns jovens se
desinteressam pelos estudos.
"Quando digo para meu filho de
11 anos estudar, ele responde
"estudar para quê? Sei que vou
para o corte. O pai sempre foi"",
relata Rosalina de Jesus, 30.
O trabalho nas usinas nem
sempre corresponde às expectativas. Ângela diz que seus filhos reclamam que ganham
pouco -menos de R$ 8 por dia.
VERIDIANA SEDEH participou do 43º Programa
de Treinamento em Jornalismo Diário da Folha,
que foi patrocinado pela Philip Morris Brasil e
pela Odebrecht
NA INTERNET - Áudio do projeto
que une pais e filhos, música do coral de meninos, galeria de fotos, textos sobre outros projetos de Araçuaí http://www.folha.com.br/071805
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