São Paulo, domingo, 01 de setembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

SAÚDE

Fumantes têm seis vezes mais chances de enfrentar o problema; uso de anticoncepcional eleva risco em até 30 vezes

"Epidemia" de infarto afeta mulher

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Mulheres fumantes têm seis vezes mais chances de sofrer um infarto do que as não-fumantes. Quando utilizam pílula anticoncepcional, o risco pode ser até 30 vezes maior, segundo estudo da Escola de Saúde Pública da Universidade de Boston (EUA).
As más notícias para o público feminino não param por aí. A relação de mortalidade por doença arterial coronária entre homens e mulheres, que em 1970 era de dez homens para cada mulher, é hoje de 2,45 homens para cada uma em São Paulo.
Segundo o cardiologista Antonio Carlos Carvalho, professor da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), já existe uma "verdadeira epidemia" de infartos entre as mulheres brasileiras. Tanto que o assunto será um dos destaques do congresso anual da Sociedade Brasileira de Cardiologia, que ocorre neste mês em São Paulo.
Carvalho afirma que na faixa etária acima dos 70 anos a mulher já alcançou o homem em número de mortes, com uma relação de 1 para 1.
Uma das explicações para isso seria que, após a menopausa, as mulheres apresentam uma queda de estrógeno, hormônio feminino que, entre outras funções, promove elevados teores de lipoproteínas de alta densidade (HDL), apelidadas de "bom colesterol", responsáveis por manter as artérias livres de arteriosclerose (acúmulo de gordura no vaso sanguíneo).
Entre as mulheres mais idosas, a obesidade, o sedentarismo e o diabetes tipo 2 são os principais fatores de risco para o infarto, segundo o cardiologista Antônio de Pádua Mansur, 46, diretor da Unidade de Emergência do Incor (Instituto do Coração).
Pesquisa realizada com 249 mulheres infartadas, que passaram pela unidade cardiológica do Hospital São Paulo, mostra que 35% das que tinham mais de 75 anos eram diabéticas e 66,6% sofriam de hipertensão.
Para a enfermeira Rita Simone Lopes, autora do estudo, a mulher mais idosa não acredita que possa infartar, nem mesmo quando sente os sintomas característicos da doença, como dor no meio do peito, que pode irradiar-se para os braços, as costas e o estômago.
Além disso, segundo o cardiologista Mansur, muitos serviços de saúde não-especializados em cardiologia demoram para diagnosticar o infarto em mulheres.
Pesquisa feita no ano passado por médicos ingleses mostra que, entre as mulheres que sofrem infarto agudo, as mortes ocorrem três vezes mais que entre homens nas mesmas condições. Uma das principais causas disso seria o atendimento médico precário ao qual as mulheres são submetidas.
Entre as mulheres mais jovens, o cigarro é o inimigo número um do coração. Estima-se que a prevalência do tabagismo entre as mulheres adultas (de 15 a 64 anos) tenha passado de 10%, em 1970, para 25% em 2000.
A relação do fumo com os infartos também fica clara na pesquisa da enfermeira Rita Simone. Entre as mulheres com até 55 anos, 66% eram fumantes.
Segundo a cardiologista Jaqueline Issa, do Ambulatório de Tabagismo do Incor, o grande problema é que as mulheres fumantes têm mais dificuldades do que os homens de deixar o vício. "Há a preocupação de engordar."
Um estudo do Hospital do Coração de São Paulo, feito com cem pacientes, mostra que o medo de engordar na abstinência é um obstáculo para 90% das mulheres na hora de deixar de fumar.
A copeira Maria Isabel Matias, 47, que costumava fumar um maço de cigarros por dia, é um exemplo típico da dificuldade de largar o vício. Em três anos, ela já sofreu dois infartos, o mais recente no último dia 16. Ainda assim, não se convenceu de que foi o cigarro a principal causa dos infartos.
"Se foi mesmo, desta vez vou tentar parar de fumar", afirma, sem demonstrar muita convicção. Após o primeiro infarto, ocorrido na véspera do Natal de 1999, ela até que tentou deixar o cigarro. Conseguiu abster-se durante uma semana. Depois, deixou de lado os remédios para a hipertensão e se entregou novamente ao vício.
Desta vez, Maria diz que conta com o apoio das filhas, também fumantes, de 22 e 23 anos. "Elas prometeram não fumar mais dentro de casa", afirma.


Texto Anterior: Há 50 anos
Próximo Texto: Droga é eficiente contra tabagismo em cardíacas
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.