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Escolas contratam "experts" para modificar o currículo
Professores da USP e da PUC ajudam colégios particulares a se adaptarem ao Enem
O objetivo é inserir na grade curricular o conceito de habilidades e competências exigido no exame feito pelo Ministério da Educação
TALITA BEDINELLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Neste ano, alunos do ensino
médio do colégio Santa Maria
(zona sul de São Paulo) receberam um convite inusitado: ir à
uma exposição na OCA (no
Parque Ibirapuera) que falava
sobre variações no clima. O que
causou espanto não foi a atividade, mas a origem do convite:
veio do professor de química.
Em meio aos vídeos e instalações sobre mudança climática,
assunto de geografia, aprenderam o que é a chuva ácida e
quais os gases que a promovem,
tema da área de química. Para
terminar, tiveram que escrever
uma redação, atividade típica
das aulas de português.
"Poderíamos, ainda, ter incluído a física, explicando o
efeito estufa", conta Luis Robson Muniz, professor de química da escola. Responsável pela
salada educacional, ele explica:
"Hoje, a tônica da educação está cada vez menos na disciplina
em si e mais em um tema a ser
abordado por vários professores. É como os alunos aprendem a relacionar conteúdos".
Preocupadas justamente em
adaptar seus currículos a essa
nova realidade, exigida pelo
Enem, as escolas particulares
estão contratando a assessoria
de "experts" -entre eles professores da USP e da PUC-SP.
O objetivo é tornar as aulas
mais interdisciplinares e focadas no cotidiano do aluno para
que ele possa desenvolver o
conceito de habilidades e competências exigido pela prova do
MEC -onde o estudante sabe
usar o que aprendeu para analisar a sociedade em que vive.
No caso do Santa Maria, por
exemplo, o professor queria desenvolver com os alunos a competência de analisar como e
quais intervenções humanas
destroem o ambiente. Para isso, passou para eles a habilidade de identificar os poluentes e
seus efeitos na natureza.
Outra competência pedida
pelo Enem é a de compreender
a arte como uma manifestação
cultural. Então, os alunos precisam ter a habilidade de analisar como as produções artísticas explicam as diferentes culturas. Por isso, algumas escolas
estão tornando o cinema uma
disciplina obrigatória, como fará o Carlitos em 2010, assessorado por um educador francês.
"Há uma procura crescente
das escolas por projetos que
tornem o currículo mais rico,
mais interdisciplinar, mais prático. As escolas têm visto que
esse é um caminho importante,
que é uma tendência mundial",
diz a coordenadora do programa de pós-graduação em educação matemática da PUC-SP,
Célia Maria Carolino Pires, que
também assessora escolas.
O professor do Santa Maria é
um exemplo: após 20 anos de
magistério, decidiu fazer doutorado em biologia, para relacioná-la melhor com a química.
"Ou eu me torno professor de
ciências da natureza ou estou
fora do mercado. Não tenho
mais que saber só química."
Além do Santa Maria, outras
grandes escolas passam por
mudanças, como o Pentágono e
o Visconde de Porto Seguro-
que contratou uma assessoria
para diagnosticar como estão
as habilidades dos alunos.
No time de especialistas de
algumas escolas há nomes como Vera Leopoldo Constantino, professora de química da
USP, e Maria José Nóbrega,
mestre em filologia e língua
portuguesa pela USP -que diz
ter observado uma procura
maior por seus serviços, a ponto de ter que recusar clientes.
Enem
As escolas reconhecem que o
Enem teve um peso significativo nessa mudança. Especialmente após as notas da prova
passarem a ser divulgadas por
escola, em 2006, facilitando a
criação de um ranking, e depois
do anúncio, neste ano, de que o
exame substituirá vestibulares
de universidades federais.
"As escolas foram resistindo,
mas agora não têm como adiar.
Elas estão sendo cada vez mais
ranqueadas com base nas habilidades e competências", diz
Silvio Freire, coordenador do
ensino médio do Santa Maria.
A resistência, segundo os
educadores, tinha dois principais motivos: os vestibulares,
que antes moviam a comparação entre as escolas, costumavam exigir mais a "decoreba"
de conteúdos; além disso, professores não queriam passar
por mudanças na forma como
davam aulas. É por isso que o
professor José Claudinei Lombardi, da Faculdade de Educação da Unicamp, vê com ceticismo as alterações: "Grande
parte dos professores tem uma
prática muito tradicional cristalizada. Acho que essas mudanças são mais retóricas".
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