São Paulo, sábado, 01 de dezembro de 2001

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INFÂNCIA

Mãe natural afirma que desistiu de dar filho para casal de professores, que alegam ter havido barriga de aluguel

Bebê com duas "mães" vai para o orfanato

ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

Um bebê nascido em 16 de outubro no Hospital do Servidor Público Estadual já tem duas mães, três nomes, mas, por decisão da Justiça, vive hoje em um orfanato.
A criança nasceu com 3,37 kg e 46 cm da barriga de Maria Aparecida dos Santos, 34, desempregada, mas que já foi doméstica e faxineira. Ela diz que, durante a gravidez, foi convencida a dar seu bebê para um casal de professores do Estado -Áureo Rodrigues Pereira de Mello Júnior, 39, e Lindalva de Lima Araújo Mello, 42.
Em vez de seguir os trâmites legais de adoção, eles decidiram que Maria Aparecida teria seu parto com os documentos de Lindalva. A intenção era facilitar que a criança fosse registrada em cartório com a paternidade do casal.
O recém-nascido, em sua primeira certidão de nascimento, foi identificado como Caio Pedro Araújo Mello, filho de Áureo e Lindalva. Arrependida, Maria Aparecida revelou a história aos enfermeiros e médicos.
"No fundo, no fundo, nunca quis dar meu bebê. Estava com medo de dizer isso para eles porque eles compraram cesta básica, fizeram sacolão, deram remédio para a minha família", diz a mãe arrependida, que, segundo parentes e vizinhos, já chegou a dar outros dois filhos. "Quando vi meu bebê, eu senti um aperto no coração. A gente tem dificuldade para viver, mas, um a mais, um a menos, não vai fazer diferença."
O caso foi parar no 36º DP (Paraíso), onde os dois professores estão sendo enquadrados no artigo 242 do Estatuto da Criança e do Adolescente -sonegação de estado de filiação, cuja pena varia de dois a seis anos de reclusão.
O bebê ficou um mês no hospital, mas, por decisão da Vara Central da Infância e da Juventude, acabou sendo levado ao abrigo Solar da Alegria (zona leste), onde foi batizado como Hamilton José.
Depois de receber alta médica, Maria Aparecida registrou a criança com outro nome -Adriano Alexandre dos Santos.
As duas partes prometem brigar na Justiça pela guarda de Caio, Hamilton ou Adriano. Depois de viver alguns dias no Solar da Alegria, ele está hoje em um orfanato mantido pelas irmãs São Vicente de Paula, no centro, com outras 78 crianças. O nome oficial dele dentro da instituição é Hamilton -embora seja mais conhecido como "aquele dos três nomes".

Barriga de aluguel
Para ter a guarda do bebê, Áureo e Lindalva contrataram um advogado, alegando que, por terem dificuldade para gerar um filho pelos métodos normais, fizeram uma fertilização in vitro. Maria Aparecida teria apenas cedido sua barriga de aluguel -técnica na qual uma mulher empresta seu útero para implante de um óvulo fertilizado de outra mulher.
O defensor deles, Jair Jaloreto Júnior, pensou em pedir teste de DNA para provar que o bebê tinha sido concebido a partir das células reprodutoras do casal. Mas desistiu porque Áureo e Lindalva não apresentaram provas -não revelaram os médicos nem as clínicas por onde passaram.
O Conselho Federal de Medicina só permite a utilização de barriga de aluguel quando há relação de parentesco de até segundo grau entre os envolvidos.
"Foi experiência sigilosa. Os médicos pediram segredo absoluto", diz Áureo. "O Áureo estava muito obstinado. Por isso os médicos resolveram ajudar, sem cobrar nada. Praticamente não tive participação. Os médicos tiraram meu material [óvulo" sem que eu soubesse. O Áureo só me contou depois de uns meses que seria mãe de verdade", diz Lindalva.
A história é desmentida por parentes, amigos e vizinhos de Maria Aparecida, que dizem ter acompanhado a gravidez dela e mostram comprovantes de consultas em um pronto-socorro municipal. O pai do recém-nascido, segundo eles, é Elton dos Santos, ex-namorado de Maria Aparecida, pai de duas crianças que moram com ela, mas que abandonou a casa meses atrás.


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