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OPINIÃO
Fraude viola preceitos constitucionais
ROBERTO DIAS
ESPECIAL PARA A FOLHA
Como noticiado ontem nesta
Folha, o concurso para contratar fotógrafos periciais, realizado em julho pelo Instituto de
Criminalística da polícia de São
Paulo, foi fraudado. Um dos
candidatos era parente do diretor do instituto e, apesar de ter
errado várias questões do exame oral, foi aprovado.
A Constituição, logo em seu
art. 1º, prevê que o Brasil é uma
república e se constitui em Estado Democrático de Direito.
Esses dizeres não são vazios de
significado. Ao contrário, têm
várias e relevantes repercussões jurídicas, como a submissão de todos -governantes e
governados- à Constituição e à
lei, a obrigação de dar publicidade aos atos do poder público,
a imposição de respeito à igualdade e a observância dos princípios da impessoalidade e da
moralidade administrativa.
A fraude noticiada viola todos esses preceitos constitucionais. Ao realizar a prova oral
-dando, supostamente, visibilidade e transparência à seleção
dos candidatos-, a administração pública encobria, de forma
dissimulada, a preferência por
certos candidatos.
Ao dar preferência a determinados concorrentes, ignorava o postulado da igualdade. Ao
escolher, previamente, os candidatos que seriam aprovados,
sem a apreciação de seus verdadeiros méritos, negligenciava o
princípio da impessoalidade.
Ao escolher um parente do diretor do instituto que contrataria os aprovados, agia de modo
absolutamente imoral.
Aliás, ao tentar contratar um
parente, fraudando o concurso
público e burlando todas as
normas constitucionais mencionadas, pretendeu-se, por
uma via oculta, dar um ar de legitimidade à reprovável prática
do nepotismo.
Como se não bastasse, a resistência da administração pública em fornecer ao jornal os
DVDs com os registros da prova oral mostra o intuito de
ocultar o que deve ser público.
Como mencionado por Bobbio,
a democracia é o governo do
poder visível, que não aceita o
mistério. O próprio Supremo
Tribunal Federal, em várias
ocasiões, já afirmou que o poder que oculta e se oculta foi rejeitado pela atual Constituição
brasileira.
A publicidade dos atos da administração pública é fundamental para viabilizar seu
controle e, também, para alcançar a responsabilização dos
agentes públicos que agem
ilicitamente. Não se pode falar
em controle da atuação governamental sem a explicitação
de suas condutas e de suas
intenções. E isso é da essência
de uma república que se diz
um Estado Democrático de
Direito.
Diante de tantos escândalos,
dos antigos dólares na cueca
aos mais recentes reais nas
meias, pode parecer que um
concurso viciado não tenha
tanta importância. Engano.
A fraude noticiada é gravíssima, pois atinge o coração da
Constituição.
ROBERTO DIAS é advogado, doutor em direito
do Estado, coordenador do curso de Direito da
PUC/SP e professor de direito constitucional da
mesma universidade
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