São Paulo, domingo, 02 de janeiro de 2011

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GILBERTO DIMENSTEIN

Um brinde à saúde


30% dos estudantes de SP ficam "altos" pelo menos uma vez por mês e o crack já está em todo o país


NADA PREOCUPA TANTO o brasileiro como a saúde pública, segundo recente pesquisa do Datafolha: é generalizado o descontentamento com a dificuldade de acesso ao serviço e com a sua qualidade. Mesmo assim, por incrível que pareça, a saúde mereceu um brinde nas festas de fim de ano. Foi aí que colhi algumas das melhores notícias do ano.
À primeira vista, parece estranho afirmar isso, afinal, como mostrou a repórter Cláudia Collucci nesta Folha, um paciente com câncer chega a esperar até seis meses por uma radioterapia. É algo como esperar horas por bombeiros quando uma casa está pegando fogo.
Basta, porém, ler algumas das últimas informações divulgadas para ver a dimensão de certas conquistas, resultado de décadas de mobilização, que nasceram de experiências localizadas em alguns municípios e depois disseminadas. Segundo números do Ministério da Saúde, vem caindo o número de mortes associadas ao fumo. As pessoas já fumam menos. Há menos mortes por doenças do coração porque há mais cuidado com a alimentação e mais preocupação com a prática de exercícios físicos.
Quem conhece o poder da indústria do tabaco sabe o que significam essas conquistas. Portanto, valeu o brinde aos educadores da saúde.

 

Pesquisa da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) mostrou queda no número de fumantes e no consumo de álcool e drogas entre os estudantes do Brasil. Apesar dos patamares ainda indecentemente altos, há batalhas vitoriosas nessa guerra. Mas o perigo continua: 30% dos estudantes da cidade de São Paulo ficam "altos" pelo menos uma vez por mês e o crack já está em todo o país.
A preocupação é tão grande que o futuro secretário da Saúde de São Paulo, Giovanni Cerri, prometeu fazer da educação contra o abuso de álcool prioridade de sua gestão. Uma de suas medidas será a disseminação de uma experiência feita com jovens da favela de Heliópolis, que, com a ajuda de especialistas em saúde pública, foram treinados para falar à sua comunidade sobre os perigos da dependência química.

 

Os números divulgados em dezembro indicam que continua a cair a mortalidade infantil, resultado das políticas de educação, do atendimento às gestantes e do saneamento básico. Aumentou ainda mais a expectativa de vida do brasileiro. Além disso, ocorreu redução acentuada da gravidez precoce, embora a situação continue crítica.
Poucas coisas são tão socialmente devastadoras como a gravidez precoce, que subtrai da mãe a chance de prosperar e condena o filho à vulnerabilidade, mantendo o círculo vicioso da miséria.
Reduzir a gravidez na adolescência significou vencer as barreiras de preconceitos, distribuir contraceptivos na rede pública e convencer as jovens de que, até a idade adulta, é melhor cuidar dos estudos do que de um filho.

 

Outra notícia importante foi a queda da taxa geral de homicídios no país, segundo relatório do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, fruto da combinação do esforço da polícia com ações comunitárias e educacionais.
São Paulo serviu de laboratório para as metrópoles ao reduzir em extraordinários 70% sua taxa de assassinatos. O homicídio já está quase saindo da condição de epidemia na cidade, segundo padrões da OMS (Organização Mundial de Saúde), o que se explica pelo policiamento comunitário, pelas mudanças demográficas, pelo uso de mais inteligência na repressão e pelas ações educativas de desarmamento, estas uma iniciativa da sociedade (do movimento Sou da Paz).
Há registros de queda acentuada em Recife. A cidade do Rio virou o maior exemplo de ação de segurança graças a uma aliança entre os governos federal, estadual e municipal, apoiados pela sociedade.

 

Com a continuidade do crescimento econômico, o envelhecimento da população e a evolução da escolaridade, além, é claro, dos programas de saúde pública, todos aqueles indicadores não vão parar de melhorar.
A boa notícia (má para os governantes) é que a pressão por melhores serviços só vai aumentar. E não vai custar barato, afinal a agenda do brasileiro está cada vez mais sofisticada. Será por muito tempo uma das três prioridades dos brasileiros ao lado de educação e segurança.
Mas, enquanto isso, dá para comemorar algumas conquistas que custaram muito esforço de um punhado de gente inovadora.

 

PS- Sugiro aos futuros governantes, a começar da presidente Dilma, que vejam os resultados de experiências em municípios (como SP e Sorocaba) que aplicaram projetos de saúde preventiva aos estudantes. Não só melhoraram o desempenho escolar deles mas evitaram gastos futuros. Gasta-se pouco e economiza-se muito.

gdimen@uol.com.br


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