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São Paulo, domingo, 02 de fevereiro de 2003

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ENTREVISTA

Anestésico "da USP" está à venda

BRUNO LIMA
DA REPORTAGEM LOCAL

O primeiro anestésico brasileiro, criado no Laboratório de Anestésicos Locais e de Estudo da Dor do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, está à venda e ganhará até março duas versões que permitirão o uso também no pós-operatório e na oftalmologia.
A universidade e a pesquisadora que inventou o anestésico, a médica anestesiologista e professora de farmacologia da USP Maria dos Prazeres Barbalho Simonetti, 62, devem receber em 20 dias o primeiro retorno financeiro com a venda do produto.
Batizado inicialmente de simocaína, por causa do sobrenome da pesquisadora, o anestésico (injetável e de uso hospitalar) ganhou o nome de novabupi -a matéria-prima do estudo foi a bupivacaína, um dos anestésicos de uso local mais utilizados no mundo.
Em 2001, aFolha noticiou a descoberta, que ainda era uma promessa. Ficou comprovado que o anestésico começa a fazer efeito antes dos outros, dura mais tempo e tem menos efeitos colaterais.

Folha - A sra. diz que o anestésico nasceu de uma idéia simples.
Maria Simonetti -
O anestésico bloqueia o caminho da dor, é uma barreira que não deixa o trem chegar à estação, que é o cérebro. Na anestesia regional [local], a agulha pode atingir um vaso sanguíneo, por erro médico. O anestésico não discrimina se é nervo ou coração e pode fazer o trem parar no coração, causando uma parada cardíaca muitas vezes irreversível. A bupivacaína é o mais eficiente dos anestésicos, mas, ao mesmo tempo, extremamente tóxica para o coração.
Já se sabia que o anestésico era formado por dois tipos de substância e que só uma delas era ruim. Já tinham tentado usar só a parte boa, mas só com ela o anestésico fica fraco. Em uma noite de insônia, tive a idéia de colocar 75% da parte boa e 25% da ruim. É incrivelmente simples, mas ninguém havia pensado nisso antes. Isso dá uma boa anestesia, sem os mesmos riscos para o coração.

Folha - O medicamento está sendo vendido com sucesso?
Simonetti -
Não temos números, mas devemos receber a primeira parcela de royalties daqui a 20 dias. A patente ainda não saiu, é um processo demorado, mas a USP cedeu os direitos de comercialização ao laboratório Cristália, que é genuinamente nacional.
Deram o nome de novabupi, meu nome caiu fora. Mas o importante é que isso vai ser revertido em dinheiro para pesquisa no Laboratório de Anestésicos Locais e de Estudo da Dor. O invento perdeu o nome, mas não perdeu a dignidade nem a eficácia.

Folha - Quais têm sido os usos do seu anestésico?
Simonetti -
Há vários trabalhos sendo feitos, mostrando novas aplicações, como na odontologia. Mas aí já saí de campo, não é mais comigo. Sou cientista, não mexo com o "bicho-homem", só mexo com o "bicho-rato".


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