São Paulo, domingo, 02 de março de 2008

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Garotas viram "belas da tarde" para atrair engravatado na Sé

No centro de São Paulo, prostitutas preferem trabalhar de dia por causa da segurança

Advogados da região estão entre os principais clientes; jovens cobram de R$ 60 a R$ 100 por programas com duração de 15 a 20 minutos

WILLIAN VIEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Enquanto Renata acende um cigarro, escorada na parede do sebo Nova Floresta, na praça João Mendes, centro de São Paulo, o sino da catedral da Sé badala três vezes. São 15h, carros buzinam e camelôs vendem relógios no grito. Um deles olha e comenta: "Aquela gostosa vai cair na minha". E acena. "Se eu te pego, eu te acabo", ela responde. Eles logo vão embora.
Talvez voltem amanhã mais cedo e marquem com outra das quatro garotas de pouca roupa apoiadas no sebo da João Mendes -prostitutas que só trabalham durante o dia, onde enfrentam menos violência e concorrência. As "belas da tarde" (referência à jovem que se prostitui no filme "A Bela da Tarde" ) cobram de R$ 60 a R$ 100 por programas de 15 a 20 minutos em pequenos hotéis do centro -segundo elas, sem cafetão e problema com polícia.
"De dia é mais seguro. A gente ouve cada história de violência e meninas abusadas na madrugada que não dá para encarar", diz Renata, nome fictício, 23. Durante o dia, "é mais difícil um babaca com masculinidade ferida te agredir". São homens, diz, que fazem cantadas, animam-se com a receptividade e se irritam ao descobrir o metiê.
A PM, que sabe das prostitutas, diz que não há reclamações contra sua presença, tampouco registro expressivo de agressões contra elas. "Muitos nem sabem que são o que são", diz um tenente da PM.
Com calças brancas coladas às coxas, Renata chama atenção pelo "psiu" que derrama sobre os transeuntes apressados.
Traz o sotaque de quem deixou Aracaju há três meses "para tentar a vida em São Paulo". Lá era caixa de supermercado, ganhava R$ 600 por mês. Hoje trabalha das 10h às 21h e faz de cinco a dez programas por dia. Custam R$ 60 ou R$ 100 -é mais caro para engravatados. O melhor horário é o almoço e às 18h, com o fim do expediente.
Descontado o dinheiro do hotel, Renata ganha de R$ 3.000 a R$ 5.000 em um mês. Pois nem sempre o cliente aceita o preço. Dinheiro que guarda ansiosa para voltar a Sergipe.
O João Mendes que batiza o lugar foi redator da lei do Ventre Livre. Sua praça abriga o fórum cível, os fundos do Tribunal de Justiça e fica perto da sede paulista da Ordem dos Advogados do Brasil. Não à toa, homens de terno circulam por aqui e um ou outro não resiste em falar com as meninas.
"Você é advogado?", pergunta Kelly, 23, quando a reportagem se aproxima. Encostada no ponto de ônibus em frente ao sebo Messias, a loira de coxas torneadas nem parece ter deixado dois filhos no Paraná para ganhar dinheiro como prostituta em São Paulo.
"Tenho muito cliente advogado", diz. Às 16h30, um homem pára em sua frente. Conversam por dois minutos e saem andando -ela na frente, requebrando rápida sobre os saltos; ele atrás, mantendo uma distância de três metros. Às 16h38, sobem a escada do hotel Atlantis, na rua da Liberdade, ao lado da Defensoria Pública.
Hospedado em um prédio neoclássico salmão, o hotel vive um entra e sai de mulheres de microssaia e homens de meia idade. Os guardas da Defensoria sorriem. E às 17h02, Kelly e o cliente saem do Atlantis. Ele vai na frente e some na multidão. Ela caminha devagar até o ponto na frente do sebo, após 24 minutos de programa.

Mais embaixo
Cinco dias depois e 3,5 km mais embaixo, já perto da região da Luz, outras mulheres oferecem o corpo de dia por preços semelhantes. Na rua Vitória, na Luz, seis delas se espremem na porta do hotel Meni. Uma tem menos de 30, as outras, menos de 25. O programa custa R$ 70, dos quais R$ 20 pagam o quarto do hotel.
"Aqui começa às 10h sem falta", diz a recepcionista, uma negra bem maquiada e sem nome, segundo ela, que se apressa em atender um rapaz de uns 18 anos. "Quero a Simone", diz ele. Ela grita e uma loira debruça-se sobre o balcão e segura no ombro do rapaz. "Oi, amorzinho", diz. Ele então tira R$ 20 do bolso e paga à recepcionista, que lhe dá em troca um chaveiro quadrado e vermelho com o número 15. São 16h12.


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