São Paulo, sexta-feira, 02 de julho de 2004

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PLANOS DE SAÚDE

Cliente que não quiser se adequar à lei atual é avisado de que passará a pagar muito mais pelo serviço

Seguradora impõe reajuste acima do oficial

FABIANE LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL

O aposentado Pedro Kuchkarian, 69, tomou um susto ao receber uma carta da Bradesco Saúde recentemente. A mensalidade de seu seguro-saúde, mantido há mais de 16 anos, aumentará em 81,6% a partir do próximo mês, índice muito acima do reajuste máximo anual autorizado pelo governo em 2004, de 11,75%.
Reajuste igual recebeu o médico Paulo, 64, que prefere não se identificar. Segurado há 30 anos pela empresa, ficou surpreso, assim como o aposentado.
Os aumentos são decorrentes da decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), de agosto de 2003, que determinou que pontos da lei que regula planos e seguros-saúde, de 1998 -a 9.656-, não valeriam para os contratos anteriores a ela -caso dos seguros de Kuchkarian e Paulo.
Segundo a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), as empresas, que vinham cumprindo os aumentos fixados pelo governo, com isso "ressuscitaram" reajustes próprios nos contratos antigos.
A ANS já registra reclamações contra a Bradesco e a SulAmérica, que juntas detêm a maior parte do mercado de 6 milhões de clientes de seguros-saúde. O setor de saúde suplementar atende hoje 38,2 milhões de pessoas no país.
Segundo o diretor-presidente da ANS, Fausto Pereira dos Santos, nos últimos dias, próximos da data de aniversário da maioria dos contratos antigos, milhares de pessoas estão recebendo cartas com propostas de reajustes -120 mil ligadas a uma das empresas seguradoras, afirma.
Ainda segundo Santos, também empresas de planos de saúde estão "ressuscitando" aumentos. "Infelizmente não são só as duas."
Alguns consumidores, como o médico Paulo, já tinham recusado uma proposta anterior, de abandonar o contrato antigo por um adequado à lei atual, o que levaria a um aumento maior ainda.
O governo ainda não sabe o que fazer. O Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça realiza hoje uma reunião com a ANS para discutir o assunto. Segundo Santos, a agência também já solicitou informações à SulAmérica e à Bradesco sobre seus cálculos.
Para a agência, a decisão do Supremo só permite reajustes próprios quando isso estiver expresso em cláusulas contratuais. "O entendimento nosso é que não podem fazer reajuste retroativo [à decisão do STF]", afirma Santos.
No caso de Kuchkarian, a Bradesco Seguros justifica o reajuste das mensalidades com aumentos dos custos hospitalares.
"O que temo, e acho que vai ser comprovado, é que [as empresas] estão fazendo recuperação de custos hospitalares de lá atrás. Com certeza, nada variou 80% a partir da decisão do STF", disse o diretor-presidente da ANS. "O cliente deve buscar explicações da operadora. Tem de procurar o órgão de defesa do consumidor, juizado de pequenas causas. E tem de notificar a ANS", afirmou Santos, ao ser questionado sobre como o consumidor deve reagir. Outra opção, disse, é mudar de empresa e negociar carências.
Segundo o diretor, no entanto, o poder de regulação da agência "é limitado". "O Judiciário cravou seu entendimento do contrato [antigo] de forma decisiva."

Caos
André Luiz Lopes dos Santos, diretor de atendimento do Procon de São Paulo, diz que o órgão recebeu uma enxurrada de reclamações de clientes de planos nos últimos dias, mas ainda não tem um balanço. "Qual a base para fazer esses reajustes estrondosos? É lamentável, E a ANS lava as mãos, apesar de termos alertado sobre isso", afirma. "Diante da situação caótica, não há outra alternativa a não ser orientar as pessoas a buscar o Judiciário." O órgão pretende questionar as empresas.
A decisão do Supremo levou a ANS a estimular um processo em massa de adequação dos planos antigos à lei atual, por entender que ela é mais benéfica na maior parte dos casos -alguns contratos antigos não cobriam câncer, por exemplo.
Anteontem, no entanto, a Justiça Federal notificou a ANS da suspensão provisória do processo, o que traz mais confusão ainda.


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