São Paulo, segunda-feira, 02 de agosto de 2010

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Associação de delegado dá título de "sustentável" a cidades miseráveis

Prefeito diz ter sido instado a pagar até R$ 5.000 para participar

RICARDO GALLO
DE SÃO PAULO

Senador Rui Palmeira (AL) está entre as cem cidades mais miseráveis do Brasil, segundo o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal.
Metade dos 13 mil habitantes não sabe ler nem escrever. A seca assola a região. A população depende do Bolsa Família para sobreviver.
Pois a cidade recebeu em maio o título de uma das "cem mais bem avaliadas e sustentáveis do país" da ANPV (Associação Nacional de Prefeitos e Vice-Prefeitos).
A entidade é presidida por um delegado plantonista de um DP de Itaquera (zona leste de São Paulo).
A entrega do prêmio ocorreu em Brasília, no Senado, diante de parlamentares.
O ranking de sustentabilidade não existe. O Ministério do Meio Ambiente diz não haver tal seleção nacional.
A escolha foi feita pela entidade, que procurou as cidades no início do ano.
Prefeitos vencedores foram instados a colaborar com dinheiro. Três disseram à Folha que a entidade lhes pediu de R$ 500 a R$ 5.000. Nem todos pagaram. Compareceram 50 dos 100 prefeitos.

CONFRATERNIZAÇÃO
Documento da ANPV falava em "recolhimento de contribuição" e deixava número de conta para depósito. Segundo a entidade, foi uma ajuda para a festa de confraternização -18 pagaram.
Matões (MA), 5.152ª colocação entre as 5.565 cidades brasileiras no IDH-M, também foi premiada.
Metrópoles integravam a lista. São Paulo foi indicada, mas o prefeito Gilberto Kassab (DEM) não compareceu nem enviou representante.
A seleção usou critérios vagos -"espírito empreendedorista do prefeito" e "gerenciamento estratégico".
Havia também aspectos objetivos, como cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal e das metas de educação e saúde. Não se trata de mérito, porém; essas são obrigações constitucionais.
Ganhou o prêmio mesmo quem não atendeu aos requisitos. "Se a sua cidade não pontuou em algum item, por certo foi bem avaliada em outros", informava a ANPV.
A entidade admitiu à Folha que a escolha não teve rigor científico. Atribuiu a seleção a levantamentos em bancos de dados públicos, além de ligações a "lideranças" e pesquisas na internet.
A ANPV afirma ter contado com a parceria da Fundação Universa, do Distrito Federal. A fundação nega. Diz que só divulgou cursos para gestores na premiação.
O Senado diz ter cedido o auditório gratuitamente.


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