São Paulo, domingo, 02 de dezembro de 2007

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A cada assassinato em Moema, 130 são mortos no Grajaú

De cada 15 mortos em SP, um é do bairro do periferia; na região nobre, índice é de uma morte para cada 2.115 habitantes da cidade

Bairro da periferia tem 7ª pior renda média da cidade (R$ 597,70), enquanto o bairro rico está na segunda colocação (R$ 5.576,78)

GILMAR PENTEADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Separadas por 20 km de distância, pouco mais de 40 minutos de carro, na mesma zona sul da cidade, duas regiões revelam os extremos da violência em São Paulo. Enquanto um morador é assassinado, em média, em Moema, uma das áreas mais nobres da cidade, 130 pessoas são mortas no Grajaú, um dos distritos mais pobres de São Paulo.
Na distribuição das mortes violentas ocorridas em toda a capital, o contraste ainda é mais visível. De cada 15 vítimas de assassinato em São Paulo, uma é moradora do Grajaú. Em Moema, essa proporção é de uma vítima a cada grupo de 2.115 assassinados na cidade.
Os números são do Pro-Aim (Programa de Aprimoramento das Informações de Mortalidade do Município de São Paulo), da Secretaria Municipal de Saúde. Eles confirmam tendência de queda ou estabilidade nos números de mortes violentas em todos os 96 distritos da capital, mas revelam que os contrastes entre periferia e áreas nobres não se alteraram.
"A vida na periferia vale menos?", questiona o sociólogo Luis Carlos dos Santos, 51, líder comunitário na região do Grajaú e Cidade Dutra, que teve dois irmãos assassinados. "A violência na periferia só se torna preocupação governamental quando rompe a barreira e chega na classe média alta."
Em Moema, sem histórico de assassinato na família, a também líder comunitária Lygia Horta, 70, tem outra explicação para os contrastes. "Aqui o nível social é maior, sim, mas somos organizados. A comunidade se conhece, participa", diz.
De janeiro de 2003, ano em que o número de mortes passou a apresentar quedas mais expressivas, até maio deste ano, São Paulo registrou 14.810 mortes violentas, segundo levantamento do Pro-Aim.
O levantamento leva em conta dados dos atestados de óbito e o endereço das vítimas -a polícia mapeia os crimes a partir dos boletins de ocorrência, que seguem o local do delito. O Pro-Aim reúne casos de homicídios dolosos e mortos em tentativas de roubo.
No Grajaú, que registra a sétima pior renda média dos 96 distritos (R$ 597,70), 914 moradores foram assassinados. São 6% de todas as mortes violentas ocorridas na capital -o distrito tem 410 mil moradores, 3,3% da população.
No mesmo ranking, Moema ocupa a última colocação. Foram sete mortes violentas desde 2003 -0,047% dos casos. O distrito de 67 mil moradores, que reúne 0,65% da população da capital, tem a segunda melhor renda média: R$ 5.576,78. A primeira é do distrito do Morumbi (R$ 6.498,82). "Claro que temos de comemorar a queda de homicídios.
Mas o padrão de vitimização continua intacto", afirmou a antropóloga Paula Miraglia, diretora executiva do Ilanud (órgão da ONU sobre delitos e tratamento do delinqüente). "A distribuição da violência ainda expressa a desigualdade social e mostra que as políticas públicas não estão acessíveis."
O perfil dos mortos no Grajaú e em Moema também mostra os opostos entre as duas regiões. Entre os 914 moradores mortos no Grajaú, 183 tinham até 19 anos. Em Moema, nenhum morador foi vítima de violência nessa faixa etária. Dos sete mortos no bairro nobre, um tinha entre 20 e 29 anos e os outros tinham mais de 50 anos.
Daniel Bruno Sciolla, 19, levou um tiro na nuca por causa de uma dívida de droga. Viciado, ele tinha deixado a cadeia 15 dias antes. Foi atingido pelas costas quando estava em um bar na região do Grajaú. A mãe, que não quer ser identificada, disse que planejou tirá-lo da região quando descobriu que ele era usuário de drogas. Abandonou a idéia por falta de dinheiro. "Se eu tivesse dinheiro para tirá-lo daqui talvez ainda estivesse vivo."


Colaborou RICARDO GALLO , da Redação


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