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PASQUALE CIPRO NETO
Joões e Joãos
Coincidência ou não,
em alguns dos últimos textos
analisei questões cujo mote foi a
propaganda. A coluna de hoje vai
pelo mesmo caminho, sugerido,
desta vez, pela (bela) publicidade
"junina" de um banco brasileiro.
"Joãos, Antônios e Pedros", dizia-se na abertura da peça publicitária, gravada em Campina Grande (PB), talvez a capital das tradicionais festas juninas realizadas
em todo o querido Nordeste.
Pensei em escrever sobre essa
propaganda para comentar o emprego da forma "Joãos", mas, como havia outros assuntos na "fila", deixei o caso para depois. O
pessoal que fez o filme foi mais rápido: nas últimas edições do comercial, a forma "Joãos" foi substituída por "Joões" ("Joões, Antônios e Pedros").
Pois é justamente a troca de
"Joãos" por "Joões" o mote desta
coluna. Nomes próprios têm plural? Se têm, o de "João" é mesmo
"Joões"? E por quê?
Nomes próprios podem ser postos no plural, sim. Por que será
que o título de uma das obras de
mestre Eça de Queirós é "Os
Maias"? Pois bem, o plural de
"João" é um caso delicado, já que
essa palavra termina em "ão". Há
padrão para o plural dessas palavras? Não há. Os únicos vocábulos
terminados em "ão" que têm plural uniforme são os paroxítonos:
todos fazem o plural com o simples acréscimo de "s" ("bênçãos",
"sótãos", "órfãos", "órgãos" etc.).
Das oxítonas terminadas em
"ão", a maior parte faz o plural
em "ões" ("corações", "portões",
"balões" etc.), mas há as que fazem o plural em "ãos" ("mãos",
"irmãos"), em "ães" ("alemães",
"cães", "tabeliães") e as que admitem mais de uma forma de
plural ("guardiães" e "guardiões"; "anciãos", "anciães" e
"anciões"). O senhor absoluto
dessa questão é o uso.
Pois foi o uso que consagrou a
forma "joões" como plural de
"joão", palavra presente em inúmeros compostos de nossa língua
("joão-teimoso", "joão-de-barro", "joão-ninguém", "joão-bobo", que, no plural, fazem, respectivamente, "joões-teimosos",
"joões-de-barro", "joões-ninguém", "joões-bobos").
Quem não se lembra dos inúmeros joões do genial Mané Garrincha (que, por sinal, se jogasse
hoje, seria massacrado pelos pobres defensores da tosca tese -roborada por alguns "jornalistas"- de que os dribles humilham o adversário)? O termo
"joão" foi tão usado e difundido
que virou verbete de dicionário.
No "Aurélio", por exemplo, encontra-se isto: "Denominação dada por Garrincha (Manuel Francisco dos Santos) aos seus marcadores". Em seguida, o dicionário
informa que, por extensão de sentido, "joão" significa "jogador
que é driblado facilmente".
Não resisto à tentação de citar
um trecho de "Paulicéia Desvairada", de Mário de Andrade: "Eu
insulto as aristocracias cautelosas! / Os barões lampiões! os condes Joões! os duques zurros! / que
vivem dentro de muros sem pulos;
/ e gemem sangues de alguns mil-réis fracos / para dizerem que as
filhas da senhora falam o francês /
e tocam os "Printemps" com as
unhas!". Como se vê, não falta registro de "joões". Aos "Joões", portanto, o que é deles, ou seja, o plural consagrado! É isso.
Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna às quintas-feiras
E-mail - inculta@uol.com.br
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