São Paulo, terça-feira, 03 de setembro de 2002

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VIOLÊNCIA

Jornalista temia fazer reportagem sobre tráfico e foi a favela por imposição de sua chefia, diz advogado da família

Viúva de Tim Lopes faz acusações à Globo

FERNANDA DA ESCÓSSIA
DA SUCURSAL DO RIO

Exatamente três meses após a morte do repórter Tim Lopes, da TV Globo, sua mulher, a estilista Alessandra de Araújo Wagner, fez novas revelações sobre o caso ao cogitar a suspeita de que ele tenha sido traído por seu informante na favela Vila Cruzeiro (Rio).
O advogado de Alessandra, André Martins, acusou a Globo de estar protegendo o informante. Ele disse que Lopes foi exposto a perigo pelos chefes imediatos na emissora -crime previsto no artigo 132 do Código Penal (detenção de três meses a um ano).
"Alessandra quer que a verdade aflore e acha que a TV Globo substitui o Estado, ao dar proteção a uma testemunha que, ao ver dela, é suspeita. A Globo tinha conhecimento de que havia homens armados. Ele ir sozinho, com a cara e a coragem, é expor a vida do trabalhador a perigo", afirmou.
Informada sobre as declarações da viúva do repórter, a Globo divulgou nota (leia ao lado).
Lopes fazia reportagem na Vila Cruzeiro (zona norte) quando, em 2 de junho, foi capturado, torturado e morto. Era sua quarta ida à favela com uma câmera oculta. São acusados o traficante Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco, e oito homens de seu bando.
Alessandra depôs como testemunha no processo, no 1º Tribunal do Júri. Por ordem do juiz Alexandre Abrahão, saiu da sessão sem dar entrevistas.
Segundo ela, o motorista da Globo que a levou ao enterro de Lopes -e que havia ido com ele à Vila Cruzeiro nas três vezes anteriores- disse tê-lo alertado de que a fonte era "peixe" (traidor).
Alessandra disse que, como Lopes não voltou para casa no horário marcado, até as 23h, ficou preocupada e desencadeou a operação de alerta. Ligou para a Globo às 4h do dia 3 de junho, tendo sabido que o motorista havia voltado, depois que Lopes não aparecera no horário previsto.
O motorista Rudmann Guilherme Castro também depôs ontem. Disse que aguardou Lopes até a 0h10 (quando o horário previsto era das 21h30 às 22h30) e que, depois de ligar pelo menos três vezes para a emissora, decidiu partir.
Às 7h do dia seguinte, segundo Alessandra, ela falou com a chefia de reportagem da Globo. Pediram-lhe que esperasse, pois a reportagem poderia ter rendido, e Tim, continuado na favela.
Posteriormente, Alessandra recebeu uma ligação da emissora, informando que as autoridades do Estado haviam sido avisadas e que o informante fora localizado. Soube também que a fonte dissera não ter visto o jornalista no domingo, fora retirada da favela e estava sob proteção da Globo.
Segundo ela, Lopes estava nervoso com a reportagem, que não havia sido proposta por ele e sim pautada pela Globo, informada pela o homem que guiou Lopes.
"Tim já estava dizendo que não tinha mais idade e que queria fazer matérias mais leves. Disse que aquela matéria era barra pesada. Chegou a dizer: "Essa eu faço questão de não assinar'", afirmou.
A estilista contou ainda que Lopes, quando fazia as reportagens, comprava e consumia drogas nas favelas, pois não tinha como adquirir o produto e jogá-lo fora.

Manifestação
A Penha, bairro onde Tim Lopes foi morto, irá homenageá-lo. O ato público ocorrerá no próximo domingo. Segundo o presidente do Sindicato dos Jornalistas do Rio, Nacif Elias, o evento será uma repetição dos anteriores, com seus participantes cobrando maior rigor do governo na punição aos assassinos de Lopes.


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