São Paulo, segunda-feira, 03 de setembro de 2007

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Doação de órgãos no Brasil cai pelo terceiro ano consecutivo

Pela primeira vez, transplante de fígado teve queda

THIAGO REIS
DA AGÊNCIA FOLHA

MATHEUS PICHONELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Pelo terceiro ano seguido, caiu no país o número de doadores por milhão de habitantes no primeiro semestre. E, pela primeira vez, foi registrada queda nos transplantes de fígado, iniciados nos anos 1980.
Os dados, da ABTO (Associação Brasileira de Transplante de Órgãos), fizeram com que a entidade antecipasse sua campanha nacional para alertar a população sobre a baixa taxa.
No primeiro semestre deste ano, o índice nacional ficou em 5,4 doadores a cada um milhão de pessoas -menos que no mesmo período de 2006 (5,8), 2005 (6,4) e 2004 (7,6).
O número também ficou abaixo dos primeiros seis meses de 2003, quando 5,6 pessoas a cada um milhão se tornaram doadores efetivos. Houve 2.221 transplantes no primeiro semestre deste ano.
Para Valter Duro Garcia, responsável pelo Registro Brasileiro de Transplantes, da ABTO, a ausência de uma política estabelecida para os transplantes, a desigualdade na distribuição dos centros e a dificuldade no fornecimento de medicamentos são alguns dos fatores que explicam a nova queda. "É apenas a ponta do iceberg do apagão dos transplantes", diz.
"O país está chegando a resultados iguais aos de 1998. Tudo o que avançou nesses anos está se perdendo agora. A nossa expectativa era crescer pelo menos 0,5 [doadores por milhão de habitantes] por ano."
O país é uma das exceções na América Latina, onde as doações têm aumentado, e com a nova queda fica ainda mais distante de países desenvolvidos. Na Espanha, por exemplo, a taxa é de 35.
Para Renato Gomes, diretor da ONG Adote (Aliança Brasileira pela Doação de Órgãos e Tecidos), do Rio, o dado é reflexo da crise na saúde no país. "Tem até médico cardiologista em greve. E o problema não é só de uma região ou de outra, é de todo o Brasil", afirma.
Segundo os dados da ABTO, Santa Catarina foi o único Estado onde houve crescimento nas doações -o índice catarinense ficou em 14,7 doadores por milhão de habitantes. No Rio Grande do Sul, houve estagnação. Todos os outros Estados apresentaram recuo. No Amazonas, não foi registrada nem sequer uma doação; nos Estados do Piauí e Alagoas, a taxa não ultrapassou 0,7.
Gomes diz que a estrutura "horrível" dos hospitais, onde o atendimento é "péssimo", também contribuiu para esse dado. Bahia, Goiás e o Distrito Federal tiveram doações que não foram concretizadas por falta de infra-estrutura.
Garcia diz que a falta de capacitação profissional em boa parte dos hospitais no trabalho de captação de possíveis doadores também ajuda a manter baixos os índices. "Os coordenadores hospitalares não são remunerados. Falta incentivo."
Um outro fator que continua sendo um entrave é a não-autorização da família. No Piauí, esse foi o motivo de 69,2% das doações não concretizadas. Em Mato Grosso do Sul, 66,7% das doações também não ocorreram por esse motivo.
Apesar dos dados negativos, o país realizou um procedimento inédito neste primeiro semestre: um transplante de coração e fígado para um mesmo receptor. Segundo a ABTO, uma cirurgia como essa jamais havia sido relatada no Brasil.


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