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Três divisões da polícia são investigadas
Valor pago pelo megatraficante colombiano Juan Carlos Abadía nos 4 casos de extorsão chegariam a R$ 2,5 milhões
Policiais suspeitos são do Denarc, do Detran e da delegacia fazendária; são ao menos dez e todos eles permanecem na ativa
MARIO CESAR CARVALHO
ANDRÉ CARAMANTE
DA REPORTAGEM LOCAL
O megatraficante colombiano Juan Carlos Ramírez Abadía
foi extorquido ao menos quatro
vezes por três divisões da Polícia Civil de São Paulo, segundo
investigação sigilosa conduzida
por promotores. Para não
prendê-lo, os policiais teriam
recebido cerca de R$ 2,5 milhões -incluídos nesse valor
um jipe Toyota, modelo Land
Cruiser Prado, e um jet-ski.
Os policiais suspeitos são do
Denarc (delegacia de combate
aos narcóticos), do Detran (polícia de trânsito) e da delegacia
fazendária. São ao menos dez,
sendo dois delegados. Todos
continuam na ativa.
A Folha revelou em agosto
último que policiais do Denarc
eram suspeitos de extorquir
US$ 800 mil do traficante. Depois disso, dois envolvidos
prestaram depoimentos revelando outras três extorsões.
Os policiais provavelmente
não sabiam que o colombiano
que extorquiam era Abadía. Só
a recompensa que os EUA ofereciam pela prisão do traficante era bem superior ao valor
que tomaram dele: US$ 5 milhões. Também não deviam conhecer a informação do DEA (a
agência antidrogas dos EUA)
de que o colombiano tinha uma
fortuna de US$ 1,8 bilhão (cerca de R$ 3,42 bilhões).
Os casos mais graves têm como protagonistas delegados e
investigadores do Denarc, a delegacia encarregada de combater o tráfico: foram duas extorsões mediante seqüestro, segundo os depoimentos.
No primeiro caso, os policiais teriam seqüestrado Pacho, apelido do colombiano
Henry Edval Lagos, um dos integrantes do grupo que acompanhava Abadía no Brasil. Pacho foi seqüestrado numa pista de kart em Aldeia da Serra, onde Abadía vivia num condomínio de luxo até ser preso pela
Polícia Federal em 7 de agosto.
O empresário Daniel Maróstica, dono de uma loja de jet-ski
na zona sul e que ajudava Abadía a comprar bens, afirmou a
promotores que o delegado
Irani Guedes Barros levou US$
280 mil para soltar Pacho.
A entrega do resgate é uma
cena de cinema à espera de um
diretor para filmá-la. O empresário afirma ter deixado os
US$ 280 mil em um Peugeot na
avenida Vital Brasil, no Butantã (zona oeste de SP), com a
chave no contato. Os policiais
levaram o carro com o dinheiro; depois de chegarem onde o
seqüestrado estava, ele voltou
com o veículo já sem os dólares.
No segundo seqüestro investigado, os policiais teriam levado Ana Maria Stein, mulher de
Maróstica, para o Denarc, no
Butantã. O empresário disse
aos promotores e aos policiais
da PF que esse seqüestro foi
conduzido pelo delegado Pedro
Pórrio, que foi do Denarc e há
uma semana dirige o setor de
investigações da 5ª Delegacia
Seccional, responsável por parte da zona leste de SP. À Folha
Pórrio negou as acusações (leia
mais na página C4).
Não é a primeira vez que
Pórrio é acusado de extorsão. O
traficante Ronaldo de Freitas,
o Naldinho, disse, em 2005,
que deu R$ 300 mil a Pórrio e a
mais dois policiais do Denarc.
O caso nunca foi investigado.
O delegado, segundo depoimento de Maróstica, pediu
US$ 1 milhão de resgate. Na negociação, Abadía abaixou o valor para US$ 800 mil, mais um
jipe Toyota e um jet-ski. O
Land Cruiser foi vendido pelos
policiais por R$ 120 mil, segundo relato dos que estiveram envolvidos no episódio.
Abadía ironizou o fato de ter
sofrido dois ataques do Denarc.
Ao depor à PF após a prisão,
disse ao superintendente em
São Paulo, Jaber Makul Hanna
Saad: "Quer acabar com o tráfico em São Paulo? Basta acabar
com o Denarc".
O custo dos laranjas
As outras duas extorsões que
o traficante diz ter sofrido têm
um motivo comum: o uso de laranjas para esconder o patrimônio que acumulava no Brasil. A delegacia fazendária da Polícia Civil descobriu que ele
comprara uma lancha de R$ 2
milhões e a colocara em nome
de um funcionário da empresa
de Maróstica. Abadía contou
que pagou R$ 400 mil para que
os policiais não fizessem uma
devassa em seu patrimônio.
O colombiano também contou informalmente a delegados
da PF que pagou propina a policiais do Detran quando eles
souberam que carros de R$ 200
mil estavam em nome de laranja. Os valores pagos, porém, não
foram apurados nem se sabe o
nome dos envolvidos.
As primeiras revelações sobre as extorsões foram feitas
informalmente por Abadía à
PF. Como os supostos crimes a
serem investigados são de caráter estadual (corrupção passiva
e extorsão, entre outros), o caso
está com o Gaeco, o grupo do
Ministério Público que investiga o crime organizado. Os promotores não se manifestam.
Alegam que a investigação está
na fase de busca de provas.
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