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RETRATO DO BRASIL
Entre 1980 e 2000, acidentes e crimes mataram 1,9 milhão; homens perdem a chance de ter 2,4 anos a mais
Violência faz brasileiros viverem menos
CHICO SANTOS
DA SUCURSAL DO RIO
O crescimento do número de
mortes violentas está funcionando como um inibidor do aumento
da expectativa de vida do brasileiro, especialmente do sexo masculino. Um estudo feito pelo IBGE
mostrou que de 1980 a 2001 ocorreram no país 1.913.186 mortes
por causas violentas. Isso fez com
que a expectativa de vida da população em geral fosse, teoricamente, 1,4 ano menor do que poderia ser. Entre os homens a influência negativa é de 2,4 anos.
São consideradas pelo IBGE como mortes violentas -tecnicamente, mortes por motivos externos- todas as ocorridas por razões não-naturais, que poderiam,
em tese, ser evitadas, como homicídios, suicídios, afogamentos e
mortes em acidentes de trânsito.
Segundo o SUS (Sistema Único
de Saúde), 68,07% das mortes
não-naturais no Brasil em 99 tiveram como causas agressões
(36,71%), acidentes de transportes (25,77%) e suicídios (5,59%).
"A violência já está deixando no
país uma cicatriz demográfica",
disse Juarez de Castro Oliveira,
gerente de Estudos e Análises da
Dinâmica Demográfica do IBGE.
O total de mortes violentas em
21 anos constatado pelo IBGE representa praticamente duas vezes
a população de Campinas (SP), a
14ª cidade do país segundo o Censo de 2000 (968.172 habitantes).
Representa ainda oito vezes e
meia os cerca de 226 mil vietnamitas e americanos mortos na
guerra do Vietnã (1959-1973).
Distribuídas por períodos menores, significam 91.104 mortes
por ano; 7.591 por mês; 253 por
dia; 11 por hora; e uma a cada cinco a seis minutos. Do total de
mortes violentas, 1.575.766, ou
82,4%, foram de homens, 75.036
por ano, uma a cada sete minutos.
Para o sociólogo Inácio Cano,
da Universidade do Estado do Rio
de Janeiro, a carência de políticas
públicas, especialmente para o
combate a homicídios e acidentes
de trânsito, é a principal razão para os dados do IBGE. Isso, segundo ele, está, em parte, anulando
ganhos obtidos em outras áreas
das políticas sociais, como na saúde e na educação.
"A sociedade clama por um plano de ação articulado e eficaz.
Não podemos mais ficar naquela
situação de retórica sobre a questão da violência", disse Oliveira.
Melhoria
Apesar do impacto negativo das
mortes violentas, a expectativa de
vida do brasileiro ao nascer vem
crescendo. Passou de 68,6 anos
em 2000 para 68,9 em 2001. Entre
1980 e 2001 a expectativa de vida
no país cresceu 6,2 anos.
Os números mostram também
que segue aumentando o hiato de
expectativa de vida entre mulheres e homens. Em 1980, as mulheres tinham uma expectativa de vida de 66 anos. Os homens, de 59,6
anos, uma diferença de 6,4 anos.
No ano passado a expectativa de
vida das mulheres era de 72,9
anos, enquanto os homens tinham uma esperança de viver
65,1 anos, um hiato de 7,8 anos.
Foi o aumento dessa diferença
que levou o IBGE a fazer o trabalho inédito de separar os óbitos
naturais dos causados por motivos externos ao longo de 21 anos.
Os técnicos queriam saber o que
estava gerando o aumento da diferença de expectativas de vida
entre os dois sexos.
A constatação foi que as mortes
por causas violentas estão na raiz
do problema. O IBGE constatou
que as curvas comparativas da
mortalidade por todas as causas e
apenas por razões naturais são
muito próximas entre as mulheres, embora tenham começado a
apresentar um certo distanciamento nos últimos anos na faixa
etária entre 10 e 35 anos.
Já entre os homens, as curvas
apresentam uma forte separação
que se acentua no período entre
15 e 35 anos de idade. Segundo os
dados do IBGE, das 1.258.528
mortes por causas violentas, ou
externas, ocorridas no país de
1980 a 2001 entre pessoas de 10 a
39 anos, 85,6% ocorreram entre
pessoas do sexo masculino.
Outro dado mostrado pelo instituto revela que, na faixa entre 20
e 24 anos a mortalidade masculina era, no ano 2000, três vezes e
meia maior que a feminina. Os
dados revelam que a diferença
vem crescendo. Em 1991 a diferença era ligeiramente superior a
três vezes. Também nas faixas etárias entre 15 e 19 anos e entre 25 e
29 anos a mortalidade masculina
é superior três vezes à feminina.
Outro exercício feito pelos técnicos do IBGE constatou que o
percentual de mortes masculinas
em relação ao total de mortes por
causas externas do país saltou de
8,54% para 15,90% entre os homens, de 1974 a 2000. Já entre as
mulheres, a variação no período
foi de 3,52% para 4,41%.
Se a comparação for apenas entre pessoas de 15 anos a 29 anos,
os números são ainda mais dramáticos. Entre os homens, a participação das mortes por causas externas pula de 39,89% em 1974 para 65,78% em 2000. No sexo feminino, também há crescimento,
mas bem menor: de 16,49% para
29,01% do total de mortes no
mesmo período.
O cálculo da expectativa de vida
serve para que o INSS (Instituto
Nacional do Seguro Social) corrija
os cálculos das aposentadorias.
Quando a expectativa de vida sobe, o valor das aposentadorias futuras cai. Até ontem à noite o
INSS não havia calculado o índice
da revisão a ser feita.
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