São Paulo, domingo, 04 de janeiro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Escritora portuguesa diz que Acordo Ortográfico é "pirata"

Para Inês Pedrosa, ortografias de Portugal e Brasil não estão sendo unificadas

Vencedora do prêmio Máxima de Literatura, dado em Portugal, diz que não vai adotar as novas regras ortográficas em seus livros

DA REPORTAGEM LOCAL

O novo sistema ortográfico é considerado "um acordo em desacordo" pela escritora portuguesa Inês Pedrosa, que promete continuar seguindo a antiga regra em seus livros. Nascida em Coimbra em 1962, Pedrosa venceu o prêmio Máxima de Literatura, dado em Portugal, com o livro "Nas Tuas Mãos". Ela já foi também diretora da versão portuguesa da revista "Marie Claire". (MÁRCIO PINHO)

 

FOLHA - A sra. é contra ou a favor do Acordo?
INÊS PEDROSA -
Sou contra, porque, para começar, o Acordo é um produto falso, um produto pirata. Na verdade, ele não estabelece um acordo. Significa, então, jogar livros fora. O Acordo Ortográfico uniformiza umas coisas, mas altera outras. Vamos supor que ele significasse a unificação gráfica do português. Tampouco sou a favor, mas isso poderia ter um interesse pedagógico. Se por um lado poderia criar um monopólio na edição, poderia gerar manuais escolares comuns, o que seria uma vantagem.

FOLHA - Por que não considera o novo sistema um Acordo?
INÊS -
Porque ele cria muita confusão, é inútil e prejudicial. É um acordo em desacordo. O hífen, por exemplo, gera confusão. Além disso, muita coisa é definida de acordo com a pronúncia, e palavras que hoje têm determinadas letras internas, como "concepção", no Brasil, não deixarão de ser escritas e faladas assim para usar a nova versão portuguesa, que muda de acordo com a pronúncia, desuniformizando-se, passando a escrever "conceção". O trema, por exemplo, que Portugal já não usava, acredito que faz falta. Como vamos explicar a quem aprende a língua que certos "us" se pronunciam? A palavra "sequestro", por exemplo: em Portugal pronuncia-se muitas vezes, erradamente, como "sekestro", sem "u".

FOLHA - O que acha da mobilização em torno ao Acordo? PEDROSA - Gostaria que todo o dinheiro gasto em encontros, viagens e reuniões para se debater o Acordo tivesse sido investido em iniciativas para promover uma ponte cultural entre os países de língua portuguesa. As iniciativas são raras.

FOLHA - Como os portugueses veem e se preparam para o Acordo?
PEDROSA -
Ainda não vi nenhum jornal anunciar que irá adotá-lo a partir de janeiro. Há portugueses entretidos em contar quantas adaptações terão de fazer em relação aos brasileiros. Mudam principalmente as palavras com determinadas consoantes internas. Mas vejo essa guerrinha de quem deve liderar as discussões do idioma português inútil. Não vejo problema de o Brasil, um país com quase 200 milhões de pessoas, liderar as discussões [Portugal tem cerca de 10 milhões]. Acredito que as diferenças hoje estão entre o Brasil e os outros países, que têm um idioma mais semelhante ao de Portugal, pois foram colônias até mais recentemente.



Texto Anterior: São Paulo: Garoto de 12 anos é detido pela décima vez
Próximo Texto: Brasil: Para Rubem Alves, o povo faz a língua
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.