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ARTIGO
Todo Carnaval tem seu fim
CECILIA GIANNETTI
COLUNISTA DA FOLHA
"Adivinha qual o meu estado civil?". Estamos no fim
do baile do Copa. São cinco
horas da manhã e a senhora
que não conseguia tirar fotos com sua câmera digital
conseguiu me achar outra
vez. Pelo tom meio trágico
que ela usa na pergunta,
chuto com segurança: Viúva. "Sim, há quatro anos. Eu
e meu marido vínhamos
juntos ao Carnaval do Copa.
Debutei aqui neste hotel."
Ela é do tempo do verbo debutar, da época em que o
baile de gala do Copacabana
Palace, criado em 1924, reinava como destino obrigatório para ricas e famosas.
Foi lá que o bustiê de Jayne Mansfield caiu em 1959 e
que Jorginho Guinle mostrou o que significava o título de playboy. Hoje, em
tempos de silicone, quando
qualquer adolescente de
bermudão e chinelos pode
ganhar a alcunha de playboy, a festa não pode parar.
Apesar das celebridades
cada vez mais escassas e das
maneiras pouco ortodoxas
de alguns como Narcisa
Tamborindeguy e Bruno
Chateubriand (os atiradores de ovos). A plebe paga
R$ 1.000 pelo ingresso; os
ricos vão de camarote, a
quase R$ 3.000 por cabeça.
O longo para as damas já
não é tão obrigatório assim,
há vários vestidinhos curtos
circulando; os homens insistem nos smokings alugados. Alguns chiquérrimos
insistem em comer seus camarões e lagostas sobre a
tampa dos pianos do Copa.
Na noite de sábado, em
outro hotel, o Glória, acontece o concurso de fantasias, criado por Arnaldo
Montel, 78, que, em sua 34ª.
edição e com cada vez menos verba, continua lotado.
No espaço que serve de
camarim para os 60 concorrentes e seu ajudantes, assisto a complicadas operações de montagem de fantasias. Descubro que as duas
moças que subiram comigo
no elevador são rapazes.
Entre os desconhecidos
mais conhecidos da cidade,
está Bolinha, um senhor
que se veste como Chacrinha. Era advogado até perceber que sua vocação era
imitar o Velho Guerreiro.
Veste-se como ele sempre.
"Viajo muito para participar de bailes, mas gosto
mesmo é do concurso do
Glória," diz. "Quando meu
nome for chamado, você vai
bater palma pra mim?"
Lembro dele quando, no
Copa, a mulher com o rosto
coberto de purpurina me
pede que adivinhe seu estado civil. Os Carnavais mais
luxuosos do Rio são também os mais solitários.
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