São Paulo, domingo, 04 de abril de 2004

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TRÂNSITO

Resultado de pesquisa em cruzamentos de SP também é motivado por demora excessiva para abertura de semáforo

1/5 dos pedestres passam em sinal vermelho

Felipe Varanda/Folha Imagem
Faixa de pedestres na av. Paulista, na altura da rua Haddock Lobo


ALENCAR IZIDORO
SIMONE IWASSO
DA REPORTAGEM LOCAL

Um automóvel a 40 km/h consegue percorrer de ponta a ponta a avenida Paulista, centro financeiro de São Paulo, em menos tempo do que um pedestre que tenta atravessar a mesma via da calçada de um lado à do outro.
Essa condição retrata o tratamento dado a quem se desloca a pé na capital paulista e no Brasil e é uma das explicações para que um quinto das travessias em alguns cruzamentos seja feito no semáforo vermelho, conforme revela uma pesquisa inédita, sob coordenação do engenheiro Horácio Augusto Figueira, da Universidade Anhembi Morumbi.
Esse levantamento foi realizado por alunos de Figueira de setembro a novembro de 2003, durante 36 horas, em seis intersecções de bairros movimentados e nobres da cidade de São Paulo. Dos 22.886 pedestres observados, 4.708 -20,57%- fizeram a travessia no semáforo vermelho. A desobediência foi maior entre os homens -24,16%- do que entre as mulheres -16,92%.
Por trás do desrespeito dos pedestres aos semáforos, porém, está uma situação de desrespeito dos governos e dos usuários de automóvel com quem anda a pé, segundo a avaliação de Figueira.
Os dados mostram que a intensidade com que os semáforos são desrespeitados pode, muitas vezes, estar relacionada à demora excessiva para a abertura do verde, bem como ao tempo reduzido reservado para as travessias.
Quem tenta atravessar a avenida Paulista nos cruzamentos com a rua Haddock Lobo e com a alameda Ministro Rocha Azevedo, por exemplo, chega a esperar até quatro minutos e 40 segundos, tempo suficiente para um carro percorrer os 2,8 km da via inteira.
Essa demora, conforme atestou a reportagem às 16h da última quarta-feira, ocorre porque os pedestres são obrigados a fazer a travessia em duas fases, tendo de ficar parados no canteiro central.
"Até os ingleses se tornam impacientes depois de um minuto de espera", afirma Eduardo José Daros, presidente da Abraspe (Associação Brasileira de Pedestres). Ele diz que os transeuntes decidem arriscar a travessia no meio dos automóveis, sob a ameaça de serem atropelados, até mesmo porque avaliam que os semáforos podem estar quebrados.
A pesquisa de Figueira -que é vice-presidente da Abraspe- foi precedida de estudos, nos dois anos anteriores, que fizeram uma avaliação do comportamento dos motoristas paulistanos -mostrando que, de cada 10 mil infrações cometidas por passagem no semáforo vermelho e parada na faixa de pedestres, apenas uma acabava sendo convertida em multa por fiscais de trânsito.
Eles também apontaram que 38,29% dos motoristas não davam seta para fazer conversões à esquerda ou à direita -índice superior aos 20,51% de pedestres que desrespeitaram os semáforos.
O levantamento sobre a desobediência nas travessias mostrou que, das seis intersecções computadas, a da rua Fernando Albuquerque com a rua Bela Cintra, na região da Consolação (centro), registrou os menores tempos totais de ciclo verde do semáforo (7,95%) e a maior média de desrespeito -61,32% dos pedestres passaram no sinal vermelho.
Dentre todos os cruzamentos analisados, a pesquisa identificou que os segmentos com maiores proporções de desobediência ao semáforo foram os homens entre 16 e 30 anos -28%- e de 31 a 50 anos -26,34%. Os mais obedientes foram as crianças e os adolescentes de até 15 anos do sexo masculino -11,06% de desrespeito- e as mulheres mais velhas, com 51 anos ou mais -11,78%. A classificação por faixa etária foi feita de acordo com a aparência dos pedestres, já que os pesquisadores não tinham como abordar todos.
"É claro que os pedestres têm uma parte de responsabilidade. Mas eles também são vítimas da falta de infra-estrutura urbana", afirma Figueira. Ele e Daros lembram ainda que, diferentemente dos motoristas, que precisam passar por testes para obter uma carteira de habilitação, os pedestres integram um grupo diversificado, incluindo até mesmo doentes mentais. Esse foi um dos motivos para a parte do Código de Trânsito Brasileiro que previa penalidades aos pedestres a partir de 1998 não ter saído do papel.


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