São Paulo, terça-feira, 04 de junho de 2002

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SAÚDE

Conferência debaterá estragos causados pela bebida

Encontro inédito discute redução de danos provocados pelo álcool

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

O Brasil vai ser a sede da 1ª Conferência Internacional de Álcool e Redução de Danos, em agosto. Não será mais um encontro para listar prejuízos que o alcoolismo provoca e convencer as pessoas a abandoná-lo. O evento será a tentativa de colocar em prática idéias para reduzir os estragos que o álcool provoca na família, no trabalho, no trânsito e como fator de geração de violência.
O conceito de redução de danos se fortaleceu no mundo com a troca de seringas para usuários de drogas injetáveis. A maioria dos dependentes que se "picava" vinha morrendo pela Aids ao compartilhar seringas, não pela droga em si. Ao trocar seringas, começaram a frequentar serviços médicos e tiveram mais chances de tratar a dependência.
No Brasil, a realização da conferência de redução em álcool coincide com uma notícia que reforça essa política: pela primeira vez, registrou-se uma queda no número de infecções entre usuários de drogas injetáveis. Nos primeiros meses de 2000, eles eram 19% do total de casos, em 2001 caíram para 14%. A queda é atribuída a dezenas de programas de troca em andamento.
"No caso do álcool, o leque de danos que podem ser reduzidos é maior do que das drogas ilícitas", diz Ana Glória Melcop, sanitarista e presidente da conferência.
Seu uso diminui o estado de atenção, tornando as pessoas mais vulneráveis. Uma pesquisa feita em grupos de Caruaru (PE) mostrou que 1% estava com HIV ou Aids; a maioria dos entrevistados informou que quando bebia não escolhia o companheiro nem usava camisinha.
Os danos aparecem em todas as áreas, de acordo com diferentes pesquisas: 40% das faltas ao trabalho e 20% dos acidentes no trabalho são devidos ao álcool. No trânsito, 61% dos envolvidos em acidentes tinham bebido em excesso. Quase 40% de todas as ocorrências policiais estão relacionadas ao álcool.
A redução de danos ainda encontra resistência entre os que defendem a abstinência como única forma de abandonar a dependência. "Reduzir o consumo já é uma forma de reduzir os danos", diz a psicóloga Mônica Gorgulho, presidente da Rede Brasileira de Redução de Danos. Nos EUA, embora as pesquisas comprovem a eficácia dos programas de redução, a política oficial vem combatendo as iniciativas nesse sentido.
Mesmo no Brasil, o tratamento clássico da dependência de drogas e álcool começa pela abstinência. "Nós trabalhamos com a idéia de que é possível uma redução gradual", diz Fabio Mesquita, que coordena o programa municipal de DST-Aids, de São Paulo.
Os grupos de Alcoólicos Anônimos, os AA, que têm cerca de 6.000 associações no Brasil, só trabalham com a abstinência por uma razão compreensível. "Não temos o menor controle sobre o álcool", diz o aposentado Carlos R., 51. "Corremos o risco de colocar uma gota na boca e só voltarmos para casa carregados."



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