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INCULTA & BELA
O cheque do xeque
PASQUALE CIPRO NETO
Colunista da Folha
Eta duplinha danada! No último domingo, a capa do caderno de esportes de um dos
grandes jornais do país estampava o título: "Defesa em cheque". Tratava-se da defesa da
seleção brasileira de futebol.
Fiquei pensando quanto vale
cada um dos zagueiros do time
de Zagallo, para ter uma idéia
do valor do tal cheque. Do jeito
que a coisa anda, o cheque deve ser magrinho, magrinho.
A expressão "colocar em xeque" vem do xadrez. Trata-se
de um lance em que o rei é atacado. Figurativamente, quando se diz que se coloca algo ou
alguém em xeque, coloca-se
em dúvida sua reputação, seu
mérito, seu valor.
Definitivamente, coloca-se
algo ou alguém "em xeque", e
não "em cheque". É bom saber que xeque também significa o homem que, entre os árabes, é o chefe da tribo, o soberano. Para esse caso, existe a
variante xeique, que no Brasil
costuma ser grafada à inglesa
("sheik"), como no famoso
filme "O Sheik de Agadir".
Nada disso: xeque ou xeique.
E xeque ainda é, ensinam os
dicionários, sinônimo de ganzá, instrumento de percussão.
Por falar em percussão, uma
dupla que também faz muita
gente sambar é caçar/cassar.
Quando se suprimem os direitos de alguém, cassam-se esses
direitos. A Câmara pode cassar
um deputado. De cassar se faz
cassação, ato de cassar.
Caçar é munir-se de alguma
arma para tentar capturar um
animal ou, figurativamente,
uma pessoa. Portanto não é
possível dizer que um deputado foi caçado, a menos que...
Não é a primeira vez que discuto nesta coluna o problema
das palavras parecidas na grafia e no som, mas diferentes no
significado. Aliás, quando
mencionei o problema pela
primeira vez, citei um trio terrível, que ainda não foi esclarecido: cessão, sessão, seção.
Cessão é o ato de ceder: "A
Câmara não aprovou a cessão
da posse do terreno".
Sessão é o tempo de duração
de um evento qualquer. É a
sessão da Câmara, tempo que
dura a reunião dos parlamentares. É a sessão de cinema, de
teatro, de ginástica, de música.
Seção, que também pode ser
secção, é o departamento, a
fração, a repartição, o setor.
Um fato curioso: ninguém
diz ou escreve que certa pessoa
trabalha na "secção" de peças
de uma loja, ou na "secção"
de frios de um supermercado.
As pessoas dizem "seção",
mas não dizem ou escrevem
que o médico vai "secionar"
uma veia, por exemplo.
Os professores de matemática são um pouco mais coerentes. Falam da intersecção de
dois conjuntos, ou seja, a parte
que é comum aos dois, e fazem
o seccionamento de uma reta.
De qualquer maneira, é indiferente empregar seção/secção,
secionar/seccionar, secionamento/seccionamento.
Quando você ler um livro,
uma revista ou um jornal impressos em Portugal, não se assuste. O "c" "mudo" é muito comum por lá: eléctrico,
atractivo, colecção, acção,
projecto, actividade. Mas não
exagere. Apesar de escrito, esse
"c" normalmente não é pronunciado. É isso.
Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna
às quintas-feiras
E-mail:inculta@uol.com.br
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