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PENEIRA JURÍDICA
Recém-graduados em direito que não passam em exames perdem função de estagiário e são até demitidos
Sem carteira da OAB, bacharel fica no "limbo"
ALEXANDRE NOBESCHI
DA REDAÇÃO
Frustração. Em cinco tentativas
de obter a carteira da Ordem dos
Advogados do Brasil, Leandro*
teve quatro insucessos. O resultado disso foi o "limbo", expressão
empregada entre os recém-graduados em direito para denominar o período em que não se é
nem estagiário nem profissional.
No caso de Leandro, o "limbo"
perdurou por mais de um ano e
meio. Oficialmente, ele não poderia continuar desempenhando a
função sem autorização da OAB.
De acordo com o presidente da
OAB-SP, Luiz Flávio Borges
D'Urso, a condição de estagiário
só pode ser mantida até o limite
de seis meses -prorrogáveis por
mais seis- após o bacharel ter
concluído a graduação.
Ao término desse período, a inscrição do estagiário na Ordem caduca e ele perde, automaticamente, o direito de exercer suas funções, como elaborar peças processuais com orientação do advogado, participar de audiências e retirar processos do fórum.
Atualmente, estão registrados
na seção paulista da Ordem
18.376 estagiários. Neste ano,
houve só 237 requerimentos para
prorrogação. "O bacharel pode
continuar no escritório, mas em
outra função. Já não pode mais
participar da atividade privativa
do advogado, como elaboração
de peças e comparecimento a audiências. Ele não é nem estagiário
nem advogado", afirma D'Urso.
Na capital paulista, um estagiário ganha de R$ 800 a R$ 1.000. O
salário de um advogado júnior
varia entre R$ 2.229 e R$ 3.972.
Para o advogado criminalista
Jair Jaloreto Junior, "esse hiato
cria um problema tanto para os
bacharéis quanto para os escritórios". O maior perdedor, porém,
na maioria das vezes, é o recém-formado. "Os grandes escritórios,
normalmente, não admitem que
seu estagiário reprove na OAB e o
mandam embora."
Natalia* se viu no meio dessa situação. Três tentativas malsucedidas de ingressar na Ordem resultaram na demissão da bacharel de
um escritório de São Paulo. "A
minha dispensa só piorou a minha situação."
Quase advogados
Os quase advogados -como
Leandro e Natalia -emergem
aos milhares a cada exame aplicado pela OAB. Em São Paulo, por
exemplo, o resultado da última
avaliação foi noticiado como alarmante. Dos 21.132 candidatos inscritos na primeira fase, apenas
1.450 obtiveram, no último dia 22,
o direito à carteira da OAB. Na segunda fase, houve recorde de reprovação: 92,84%.
A taxa pode ser entendida pelo
fato de São Paulo ser o Estado
com o maior número de bacharéis. Em 2003, as universidades
paulistas graduaram 26.848 bacharéis. No Acre, foram só 35.
Entre os 64.605 inscritos para as
provas da OAB-SP durante 2003
(são três por ano e o candidato
pode fazer quantas vezes forem
necessárias), apenas 16.788 formandos passaram.
A cada vez que é anunciado o
índice de reprovação na OAB, arma-se uma queda-de-braço entre
a Ordem e os candidatos. No embate, as universidades, principalmente as particulares, têm sua
formação colocada em xeque.
D'Urso questiona o fato da
abertura de cursos sem que haja
um controle. Segundo ele, no governo de Fernando Henrique
Cardoso (1995-2002) houve um
crescimento muito acentuado do
setor sem que houvesse rigor na
exigência de qualidade.
Na outra ponta, estudantes e entidades que representam as escolas privadas afirmam haver um
corporativismo da OAB. "Eles estão selecionando pelo corporativo, e não pelo conhecimento. Não
pode haver uma predileção pelos
alunos da USP, da PUC e do Mackenzie", contesta Heitor Pinto Filho, presidente da Associação Nacional das Universidades Particulares e reitor da Uniban (Universidade Bandeirantes).
D'Urso rebate dizendo que a
prova é igual para todos os candidatos, independentemente da faculdade. "Quem corrige as provas
nem sequer fica sabendo a origem
dos candidatos", afirma.
* Os nomes são fictícios
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