São Paulo, domingo, 04 de julho de 2010

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Pagos para brincar

Crianças são chamadas para testar, dar palpites e aperfeiçoar brinquedos antes de eles irem para as lojas; em troca, ganham de graça a peça avaliada

VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃO
DE SÃO PAULO

Não é Natal nem o aniversário, e também não é o Dia das Crianças, mas o quarto do menino Pedro Barbério, 9, está cheio de presentes.
Para alegria dos pais, aquilo tudo não custou nada. Há dois anos, Pedro assumiu um trabalho que a maioria das crianças sonharia em ter. Entre as provas da escola e as lições de casa, ele é um testador de brinquedos.
Antes do lançamento nas lojas, Pedro recebe tudo quanto é jogo, carrinho de corrida e de controle remoto, numa espécie de teste de campo do fabricante.
O pagamento é em brinquedos -os que testou e outros em linha. Depois de avaliar os produtos e apontar os defeitos, ele tem de devolver os brinquedos à fábrica e, quando chegam ao mercado, recebe um como gratificação.
Entre os problemas já apontados por Pedro, testador oficial do Autorama, da Estrela, está a velocidade, que ele considerou baixa para carrinhos de corrida.
Na versão Stock Car, recém-lançada, a aceleração foi aumentada para dar mais realidade à brincadeira.

SONHO DE VIDA
O trabalho de brincar é a coisa mais prazerosa da vida da menina Beatriz, 11, testadora da boneca Susi e dos jogos de tabuleiro, como o Banco Imobiliário, há dois anos. Se pudesse, ela largaria tudo para se dedicar à avaliação dos brinquedos. Antes uma garota tímida, a atividade, dizem os pais, ajudou na socialização com outras crianças e gerou segurança.
"Tenho vontade de fazer só isso, mas minha mãe não deixa. Diz que primeiro tenho de estudar e só se eu não tiver prova é que posso brincar", afirma Beatriz.
"No início fiquei preocupada que criasse uma vaidade. Não deixamos que ela se sinta melhor por causa disso, não é a coisa mais importante da vida", diz Fátima Bíscaro, mãe de Beatriz.
Em dois tempos, a Estrela mudou o corte de cabelo, as roupas e os acessórios da boneca Susi, que Beatriz não havia gostado. O trabalho de avaliação dura 1 hora e meia.
As mães têm de controlar com pulso firme. Em semana de prova, o trabalho de brincar é adiado. Compromissos com aulas de natação, piano e inglês não podem ser sacrificados pela brincadeira.
"Não sei como ela encara essa responsabilidade. A criança não sabe avaliar isso em função dos outros, só de si mesma. Vender brinquedo e fabricá-los é coisa do mundo adulto", diz a psicóloga Rosely Sayão, autora de "Como Educar Meu Filho?"
"Temos grupos de crianças que convocamos de acordo com a necessidade", diz Carlos Tilkian, diretor-presidente da Estrela.
Antes de chegar às crianças avaliadoras, os brinquedos passam por ensaios físicos e químicos para avaliar alguma possível contaminação por metais pesados e se suportam peso, queda e compressão, por exemplo.
"O objetivo é analisar o risco físico para a criança", diz o químico Adalcir Lago, chefe do laboratório de segurança do produto da Estrela.
A sorte de Pedro e de Beatriz não está para todos. As crianças são escolhidas pelo fabricante em seleções aleatórias nas escolas de acordo com o perfil de mercado.

Folha.com

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