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Festa dos solteiros só atrai "solteironas" de meia-idade
1º Festa Internacional dos Solteiros reuniu 135 pessoas, a maioria mulheres
Pacote de cinco dias para o evento, na Costa do Sauípe (Bahia), custou R$ 1.548; homens e mulheres se disseram decepcionados
PAULO SAMPAIO
ENVIADO ESPECIAL À MATA DE SÃO JOÃO (BA)
Não é fácil cumprir as promessas embutidas em um
evento chamado "1ª Festa Internacional dos Solteiros". Especialmente quando há quase o
dobro de mulheres, a maioria
delas com idades acima de 45,
como no encontro que reuniu
na semana passada 135 pessoas
em um dos ruidosos hotéis da
Costa do Sauípe, no litoral norte da Bahia.
"Só tem mulher aqui e ninguém de fora do Brasil: o encontro deveria se chamar "1a.
Festa Interestadual de Solteiras'", sugere a empresária mineira Adiene, 48.
Para o hotel, foi ótimo. De
olho nos 85 milhões de avulsos
(solteiros, separados, viúvos)
que vivem no Brasil, a cadeia
pretende promover o evento
todos os anos -como já faz em
Cuba e na Jamaica.
"Vendemos mais do que esperávamos. Nossa idéia é mudar a imagem dos encontros
para "singles", sempre ligados à
molecada, e fazer algo que busque integração, não só azaração", diz o coordenador de
marketing do hotel Breezes,
Alexandre Fernandes.
De fato, não tinha molecada.
Mas a maioria dos "maduros"
passou cinco dias esperando
que algo extraordinário acontecesse -por R$ 1.548.
"Vimos o pacote na internet,
achamos o preço acessível, era
tudo enganação. Dizia lá que vinham 500 pessoas. Ninguém
aqui imaginou que iria encontrar tanta gente da terceira idade", diz a empresária baiana
Vera, uma loura de cerca de 60,
cabelos compridos, lentes de
contato verdes, brincos pingentes de cristal e top preto de
paetês -ela janta com duas
amigas de sua idade.
Os homens não estavam
muito mais felizes. "O fato de
ter mais mulheres não quer dizer nada. Vai ver as mulheres!
Eu quero qualidade, não quantidade", pondera um jornalista
que se apresenta como JP, 60.
Pulseira amarela: "mico"
A maioria dos integrantes do
grupo preferiu não revelar o
nome para a reportagem, nem
(muito menos) posar para fotos. Diziam que já bastava serem obrigados a circular pelo
hotel usando uma pulseira
amarela, que os identificava como participantes do grupo dos
solteiros -para muitos, era "a
confissão pública do "mico'".
"Eu tô na contramão desse
povo. Não sou "singa" (feminino
de "single'). Isso é preconceituoso. É como baile dos "gay",
dos "pobre", dos japonês" (sic)",
diz uma empresária paulista
casada quatro vezes, que "fugiu" para Salvador à noite.
À medida que o desastre vai
se tornando inevitável para
muitos, começa o tiroteio.
"Os homens são poucos, e
fracos", torce o nariz a secretária paulista Deise, 40.
E qual o seu tipo?
"Meu tipo é homem [pausa].
Que não seja viado, entende?.
Os gays são divertidos, mas o
que eu vou fazer com eles?
Imagina você rodeado de sapatões.." (Ela não soube mostrar
um gay por perto).
Várias mulheres se atacam (à
distância): elas apontam a "piranha"; a que exagerou no botox ("Até assustou aquela
criancinha!"); palpitam na cobertura ("Não tira foto dessas
derrubadas!"); contam histórias de homens que as beliscaram na bunda ("Pode"?) e das
cantadas absurdas.
Mas são denunciadas: "Você
acha que elas foram atacadas à
toa? Aqui tem muito peito murcho se fazendo de mocinha",
acredita a sergipana Roseana,
47, separada, três filhos. Ela
diz: "Tô amando o encontro! Eu
amo tudo! A gente está num lugar lindo, esse céu, esse mar,
vou me aborrecer por quê?"
Roseana topa posar para fotos com o empresário baiano
Oswaldo*, 45, separado; segundo a maior parte das mulheres,
Oswaldo "ciscou todas!". "Esse
tá desesperado!", dizem.
Os homens são mais simples
ao justificar o fracasso: "Rapaz!
É muita velharia. Me venderam
outra coisa", diz o comerciante
Léo, 34, de Recife, um dos mais
jovens do evento.
A reportagem foge do tiroteio, para descansar. No quarto,
ouve um batuque pachorrento
vindo da piscina, onde o grupo
musical do hotel repete: "Vôôô
pru canaviáá!". É como se estivesse em um filme americano
sobre índios brasileiros.
Cupido, não!
Yolanda Oliveira, 55, agente
de viagens paulista que trabalha com solteiros há dez anos e
vendeu o evento da Bahia em
parceria com o hotel, diz:
"Sempre deixo claro que não
sou cupido. Bolei esses programas porque ouvi muitas reclamações de gente que viaja sozinha e paga diária de casal, ou se
vê cercada de crianças. Tinha
passageiro que voltava dizendo
que só conseguiu fazer amizade
com o motorista do citytour."
Segundo ela, "o problema é
que as pessoas criam expectativas de arrumar alguém e, se não
acontece, nada mais agrada."
Mas tem o outro lado disso: o
solteiro que consegue um parceiro e não vê nenhum defeito
no evento. "É a melhor viagem
que eu já fiz na vida!", diz Dalva,
50, dentista e professora universitária em Brasília, que está
de mãos dadas com um administrador de empresas de 55
anos, separado, dois filhos (ele
não diz o nome), que ela conheceu no traslado para o hotel.
Pergunta-se: onde os recém-conhecidos transam, já que são
duas ou três pessoas em cada
quarto? "Durante o dia, enquanto duas estão na praia, a
terceira leva o cara para o quarto", diz Oswaldo. Dalva reage:
"Eu, não! Paguei R$ 700 de diária a mais para ficar sozinha.
Meu dia vale isso!"
Cunhada do marido
A publicitária Elisa Maria,
60, que se define como "sexygenária" e vai a muitos eventos de
solteiros, concorda com a agente Yolanda: "Eu posso dar uns
pegas, beijo, converso, mas não
estou aqui para arrumar namorado. Agora: tem mulher que
não é feia, nem burra: é chata
mesmo. E fica sozinha."
Separada, Elisa conta que o
ex-marido casou com a irmã
dela e virou seu cunhado. "Fiquei feliz porque ela toma conta dele", diz a publicitária, que
foi eleita "a solteira do evento".
O "solteiro" foi o engenheiro
carioca Hermes, 48, separado,
dois filhos. Como todos os que
estão se divertindo, ele parece
interessado apenas em "interagir". E o que leva alguém a comprar um pacote para solteiros?
"Quando vou ao cinema sem
companhia, fica todo mundo
olhando, me sinto estranho.
Aqui, eu tô sentado em uma
mesa cheia de gente e penso:
"Caraca! Eu não tô excluído"."
Seu companheiro de quarto,
o paulista Ricardo, 38, que está
em seu oitavo encontro para
solteiros, diz que sempre fica
com alguém (a moça não quis
se identificar). Mas é preciso ir
a um evento assim para ficar
com alguém? "Você conhece
muita gente, é gostoso", diz.
De noite, na boate
Na boate acontece uma espécie de "catarse single". Como é
"sistema de open bar" (bebida
grátis), a maioria relaxa depois
de algumas caipirinhas:
"Olha, quando me falaram
desse encontro, imaginei muita
mulher sapatona, bicha e travesti", diz a cabeleireira paulista Dirce, 55, que dança o tempo
todo. Ela conta que nunca se
casou porque não teve tempo.
No dia seguinte, Adiene, a
mineira do terceiro parágrafo,
diz que, apesar do "desentrosamento geral do encontro, o serviço do hotel é muito bom"
"Hoje, acordei com enxaqueca e me levaram café no quarto.
Não agüento esses perfumes
fortes [das mulheres], tenho
alergia a desinfetante."
Hermes, que acompanha o
dia-a-dia da reportagem, observa. "Isso aí não é uma matéria, é
um boletim de ocorrência."
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