São Paulo, sexta-feira, 05 de março de 2010

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BARBARA GANCIA

A hipocrisia a serviço da mulher



Porque a publicidade com a Juliana Paes é infame, devemos fechar o olho para a da Paris Hilton?

RESPONDA rápido: por que o Conar (Conselho Nacional de Propaganda) encrencou com o comercial da cerveja Devassa que mostra a refinada intelectual norte-americana Paris Hilton, na intimidade, resolvendo equações sobre a teoria gravitacional do próprio derrière?
a) Porque vender uma vesga, nariguda, sem bunda como devassa é propaganda enganosa; b) porque o órgão que regula a publicidade tapuia não quer ofender a Lady Gaga nem o cantor Belo ou c) porque ninguém aguenta mais piada sem graça sobre papagaio e loraburra.
Sabe o que a Paris Hilton faz depois de passar a noite inteira enchendo a cara de Brahma? Ela acorda e vai para casa. Tem também aquela de que a Paris Hilton entra num bar e pede: "Moço, me dá uma Schlitz", mas essa não dá para contar aqui, senão é capaz de o Conar ficar emburrado até dezembro.
Tenho um amigo que participa do Conar. Ele não é profissional de propaganda, mas faz parte do conselho.
Vira e mexe é chamado a opinar sobre alguma questão tão intricada quanto essa do comercial da cerveja Devassa e, como leigo, ele vai lá e lê a papelada que lhe é enviada sobre o assunto e depois emite um parecer qualquer. Meu amigo é pessoa de bom senso e cidadão a quem eu confiaria meu cão e personal trainer, Pacheco Pafúncio, para dar uma volta no quarteirão ou até para passar o fim de semana no Guarujá; não discuto sua integridade. Certa vez perguntei a ele qual o critério técnico que ele utiliza para avaliar as questões do Conar que lhe são submetidas e confesso que sua resposta não me tranquilizou.
Ao contrário, deu-me a impressão de que, para ele, fazer parte do Conar é uma atividade que confere prestígio, mas que passa em 15º lugar no seu rol de atribuições cotidianas. Algo que ele procura fazer muito bem feito, mas que, não sendo seu trabalho nem sua especialidade, acaba não tendo lá grande legitimidade.
Por outro lado, digamos que você trabalhe na Antarctica, na Brahma ou na Itaipava. Aí, sim, a questão da cerveja Devassa passa a ter enorme importância. Pense. Sua concorrente conseguiu fazer o maior auê numa ação de marketing que juntou o Carnaval a uma pseudocelebridade internacional e colocou no ar uma campanha que está dando o que falar e ocupando o espaço da Brahma, que afinal pagou coisa de R$ 1 milhão pela horinha e tanto que Madonna passou no seu camarote da Marquês de Sapucaí.
Se lhe fosse dada, mesmo que por vias outras que não as mais alvas, a opção de apresentar um recurso jurídico para contestar a publicidade da concorrente e dizer que ela fez uma peça sexista que explora as mulheres, você ficaria dormindo no ponto? Pois é. O Conar teve de lidar com essa questão concreta e agiu, mesmo que de forma aparentemente arbitrária ou hipócrita, na melhor das intenções.
Ou será que toda publicidade de cerveja que usa a mulher para vender o produto não é boçalizante e nociva? Porque a publicidade com a Juliana Paes é infame, devemos fechar o olho para a da Paris Hilton?
Da próxima vez que pintar um comercial com uma atriz global rebolando toda suada para vender cerveja, será que não se poderá usar o precedente do comercial da Devassa como "jurisprudência'? Seja pelo motivo que for, em algum momento a gente precisa sair da idade da pedra, não é mesmo?

barbara@uol.com.br

www.barbaragancia.com.br

Twitter: @barbaragancia


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