São Paulo, segunda-feira, 05 de abril de 2004

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LEI SECA

Presidente evita ser fotografado fumando, mas bebe em público

Especialista critica atitude de Lula

DA REPORTAGEM LOCAL

Se por um lado o governo é elogiado por debater uma regulamentação das bebidas alcoólicas pela primeira vez na América Latina, uma possível associação da imagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao álcool preocupa especialistas. "Existe um processo educativo que acho que deveria ocorrer com Lula", disse à Folha, de Washington, Maristela Monteiro, responsável pelos programas de combate ao álcool da Opas (Organização Pan-Americana da Saúde).
Enquanto esconde a cigarrilha -ele já foi flagrado fumando escondido, alegando não querer dar mau exemplo-, Lula não se furta a brindar em público, como fez em outubro passado em Blumenau, na Oktoberfest (segunda maior festa de cerveja do mundo). "Morra de inveja", brincou com um fotógrafo.
Sob Lula, a caipirinha virou "bebida nacional" por decreto presidencial. Vinhos foram sorteados nas confraternizações de fim de ano. E a cerveja é metáfora nos discursos, na resposta às críticas. "O companheiro trabalha das 7h às 18h (...) e às vezes pára para tomar uma cervejinha. Quando chega em casa, não tem nenhum elogio pelas 12 horas (...), mas tem críticas pela meia hora em que tomou uma cerveja", disse o presidente em junho do ano passado.
A reportagem procurou a dirigente da Opas para que falasse sobre a questão da regulamentação da bebida e pediu um comentário sobre imagens e discursos do presidente.
"As pessoas de projeção política, como ele, e também social, como artistas, devem ter uma educação sobre o impacto do que falam. Acho que é simplesmente desconhecimento da dimensão do problema, da importância que ele tem como modelo, da postura que precisa ser benéfica para a saúde pública", afirmou Monteiro.
Procurada na última quinta-feira, a assessoria de Lula solicitou perguntas por e-mail, mas não as respondeu.
"Vou falar em termos gerais. Eu acho que todo dirigente, toda figura pública que é associada a uma política pública, deve tomar todo o cuidado para evitar associações em relação ao consumo de tabaco e de álcool. É uma questão de imagem, separar o que você faz na vida particular", afirmou Pedro Gabriel Delgado, coordenador de Saúde Mental do Ministério da Saúde.
"Eu acho que não há razão para esconder [tanto o consumo do álcool quanto do cigarro]", diz, de Seattle, a socióloga Beatriz Carlini Marlatt, pesquisadora associada do Departamento de Psiquiatria da Universidade de Washington. "Ele poderia usar o exemplo para ensinar que beber tem o seu momento e lugar", afirmou.
"Não me surpreende [a postura do presidente]", diz Ilana Pinsky, psicóloga da Universidade Federal de São Paulo especialista em propaganda de álcool, sobre o conflito cigarrilha-caneca de chope representado por Lula. "A indústria do tabaco é tida como inimiga, a do álcool não. O álcool está inserido na cultura, é tolerado." (FL)


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