São Paulo, segunda-feira, 05 de abril de 2004

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Especialista quer limitador de velocidade em carros

ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

De quem é a responsabilidade por um acidente de trânsito em que os veículos estavam acima de 120 km/h, velocidade máxima permitida em estradas brasileiras?
A pergunta do arquiteto e urbanista Nazareno Stanislau Affonso, 55, vice-presidente da ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos), poderia levar a uma resposta automática: os culpados são os motoristas que desobedeceram a sinalização e a legislação.
Affonso sugere uma discussão nova: esses veículos foram fabricados e tiveram sua venda e sua circulação autorizadas por governantes, mesmo sendo capazes de atingir uma velocidade que, pelas regras vigentes, jamais poderia ser desenvolvida. Por que liberar carros que atingem 200 km/h se é proibido ultrapassar 120 km/h?
Essa será uma das questões que ele levará para a mobilização pela paz no trânsito que uma série de entidades fará depois de amanhã, durante os eventos do Dia Mundial da Saúde, cujo tema, neste ano, é a segurança viária.
Os acidentes de trânsito deixam 1,2 milhão de mortos anualmente no mundo e 30 mil no Brasil.
O urbanista diz que a redução das vítimas passa necessariamente pela fiscalização da velocidade e que os radares, cuja imagem é rejeitada por usuários de carro, são um "equipamento de cidadania".
Affonso, para quem a segurança do trânsito não está entre as prioridades do governo federal, aponta ainda uma idéia que será discutida e que, para ele, substituiria a necessidade de radares: um dispositivo a ser instalado nos veículos que impediria a ultrapassagem de uma determinada velocidade. Leia trechos da entrevista.

 

Folha - O que é preciso para melhorar a segurança no trânsito?
Nazareno Stanislau Affonso
- O veículo motorizado faz do ser humano alguém com mais potência. Se eu tivesse no veículo um redutor de velocidade, não haveria problema. Já existe um aparelho testado nos ônibus em Vitória (ES) e existe aquele em São Paulo [que leva à desaceleração dos coletivos quando determinada velocidade é ultrapassada].

Folha - Esses equipamentos deveriam atingir os carros de passeio?
Affonso
- É a nossa expectativa. Foi uma das poucas soluções que visualizei. Um veículo que ande a no máximo 60 km/h em áreas urbanas e que tenha uma velocidade maior nas estradas. É tudo viável do ponto de vista tecnológico.
Poderia começar com táxis, depois com veículos oficiais. Até que cada novo veículo só pudesse sair de fábrica com esse sistema e com um velocímetro de até 120 km/h. A partir daí, [deveria haver] uma tarja: velocidade ilegal.
A gente tem estudado para verificar de quem é a responsabilidade por um acidente que envolva mortos e no qual os carros estavam acima da velocidade máxima permitida. Esse veículo está liberado [a circular] e foi fabricado. No momento em que se permite um limite a mais, os veículos passam a ser usados como uma arma. Mas ele foi autorizado a ser vendido e a ser usado.

Folha - Quais serão as prioridades na mobilização do dia 7 [quarta]?
Affonso
- A idéia é que esse tema entre na agenda governamental. A primeira constatação foi a de que existem prioridades no governo e que a paz do trânsito não está entre elas. Há itens como a inspeção veicular, mas ela não é um aspecto essencial, principal.
Queremos que os recursos do setor não sejam desviados para outras atividades. Nossa expectativa básica e mínima é que, nesse dia, os recursos do Funset sejam liberados [fundo formado pela arrecadação de multas e teve 70% da verba congelada em 2003].

Folha - Qual é a relevância do radar na segurança do trânsito?
Affonso
- Quando tivermos um equipamento diretamente no veículo, que limite a velocidade, os radares deixam de ser essenciais. Enquanto isso, é preciso ter esse controle. É um ato voluntário passar no radar acima da velocidade.

Folha - Mas a imagem da indústria de multas não é reforçada por aplicações equivocadas que visam essencialmente à arrecadação?
Affonso
- A indústria de multas, na verdade, é residual no processo. É aquele cara que faz uma pegadinha. Mas os radares são, de fato, um equipamento de cidadania. Para cada infração, há milhares que não são anotadas. No exagero, a sociedade e os promotores deveriam pressionar os governos por estarem prevaricando. Há uma indústria da impunidade, uma complacência do governo com os usuários de carro.


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