São Paulo, sábado, 05 de junho de 2010

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WALTER CENEVIVA

Lula, o futebol e suas penas


O presidente errou mesmo que a Justiça Eleitoral lhe dê razão, porque não pode ignorar a nobreza do cargo


O PRESIDENTE Luiz Inácio Lula da Silva, ao contrário de políticos que, para fazer média, juram amor por clubes populares de futebol, é um sincero corintiano. Por isso lembro o conselho que seu time favorito deu aos meninos do Santos: nunca debochem do adversário.
O conselho vale para o presidente, pois tem debochado das multas que a Justiça Eleitoral lhe aplicou, rindo de quem as pagará. Ainda que Marcio Thomaz Bastos, seu advogado e verdadeiro Lucio da profissão, tenha bons argumentos, nem assim Lula estará certo em rir da condenação eleitoral.
Vendo a questão sob outra perspectiva, lembro que Lula ultrapassou com argúcia e coragem todos os limites da educação formal, mas a falta desta parece ser o único modo de explicar o tratamento desrespeitoso da Justiça Eleitoral, no qual tem insistido.
O presidente da República deve recordar que a seu cargo corresponde o título de primeiro magistrado da nação. Que lhe cabem a administração federal, o início do processo legislativo, a sanção das leis. Que é do chefe do Poder Executivo o poder único de vetar projetos de lei, de exercer o comando supremo das Forças Armadas, de nomear, com a aprovação do Senado, ministros do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores.
Tais missões são algumas das que a Constituição lhe atribui prioritariamente no artigo 84. Embora Lula confesse que não gosta de ler e prefere a informação oral, deveria percorrer o referido artigo, para se inteirar do erro apontado.
Volto ao futebol. Foi unânime a crítica feita ao sr. Carlos Caetano Bledorn Verri, técnico da seleção brasileira, cujo apelido é Dunga (um dos anões de Walt Disney, na versão da "Branca de Neve" de 1937). Ao visitar o presidente da República, que o recebeu no Palácio do Planalto, Dunga o cumprimentou, mantendo a mão esquerda no bolso.
Se o técnico tivesse educação formal, saberia que o presidente da República representa o país perante as nações do planeta. Para cada brasileiro ele é a mais alta autoridade do país. Nesse caso, a formalidade do tratamento é exigida não pela pessoa do presidente, mas pelo cargo que ocupa, no qual personifica a nação. O técnico da seleção mostrou ignorar a formalidade do cumprimento. Preferiu ser Dunga em vez de Carlos Caetano.
Tomado o mesmo exemplo às avessas, Lula errou mesmo que a Justiça Eleitoral lhe dê razão, porque o presidente da República não pode ignorar a nobreza do cargo.
Pode criticar o Poder Judiciário enquanto cidadão, até para estar à altura das responsabilidades da Presidência. Pode criticar os titulares dos dois outros Poderes, que se têm manifestado, na história nacional, contra atos de presidentes da República.
A educação cívica e o próprio civismo são essenciais no exercício da autoridade. Os que aprofundaram estudos a respeito sabem que a autoridade exercente da função unitária de assegurar o respeito da Constituição e das leis não pode rir-se dos tribunais, aos quais cabe aplicar essas mesmas leis.
Nisso, presidente e técnico erraram. Marcaram um gol contra. Com uma diferença: as ações de Lula, certas e erradas, serão lembradas sempre que sua Presidência for reavaliada, pelos séculos afora. É a pena não prescritível dos presidentes da República.


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