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Mutirão de anônimos pagou, diz delegado
Nazareth Kechichian Neto admite que não há nenhum documento sobre a reforma do prédio da delegacia fazendária da capital
Policiais dizem que obra foi bancada por um grupo empresarial investigado para ter a sua situação facilitada; delegado nega
ROGÉRIO PAGNAN
ANDRÉ CARAMANTE
DA REPORTAGEM LOCAL
O prédio da delegacia fazendária da capital, órgão da Polícia Civil de São Paulo, foi reformado clandestinamente. Não
há registro oficial da obra, feita
em 2007, dos seus custos e da
origem dos recursos aplicados.
A delegacia é responsável pela apuração dos crimes de sonegação fiscal praticados contra o
Estado. Alguns dos maiores
grupos empresariais do país
são investigados ali -só os casos abertos a partir de 2007 envolvem mais de R$ 2 bilhões.
O delegado titular da fazendária, Nazareth Kechichian
Neto, admite que não há nenhum documento sobre a reforma, mas diz que as cúpulas
da Polícia Civil e da Secretaria
da Segurança Pública da gestão
José Serra (PSDB) sabiam dela.
Questionado sobre quanto
custou a reforma, responde,
simplesmente: "Não quero
nem saber". Segundo ele, um
"mutirão de anônimos" pagou
as obras. Alguém sob investigação? "Não posso falar sim, nem
não... Não vi nada", afirma ele.
E completa: "Não é que eu
não posso falar. Ponha-se no
meu lugar, meu querido. O que
vou falar a respeito disso? Peguei o bonde andando".
A obra, de acordo com o delegado, foi iniciada em março ou
abril de 2007 e terminou em 29
de outubro. Kechichian Neto
diz que as "articulações" e o início da reforma são da responsabilidade do antecessor Darci
Sassi, que dirigiu a unidade entre janeiro e agosto de 2007.
Sassi, por sua vez, hoje policial do Decap (Departamento
de Polícia Judiciária da Capital), nega participação nessa
empreitada. "Nem sei se foi reformada", afirmou. "Alguma
coisa errada tem porque estão
culpando o mordomo. Então, o
negócio é investigar", disse.
Pela Constituição Federal e a
do Estado de São Paulo, o agente público é obrigado a publicar
seus atos no "Diário Oficial",
sob o risco de sanções previstas
no crime de improbidade administrativa, como a perda do cargo e pagamento de multas. As
doações, segundo o decreto nº
25.644, de 7 de agosto de 1986
(ainda em vigor), também devem ser publicadas no "Diário
Oficial" pela Secretaria da Segurança Pública do Estado, por
menor que seja o valor do bem.
Policiais que pedem anonimato dizem que a reforma, que
seria na avaliação deles de mais
de R$ 500 mil, foi bancada por
um grupo empresarial investigado pela polícia com o intuito
de ter sua situação facilitada. A
Folha não tem até o momento
conhecimento de nenhuma
prova sobre esse fato.
O delegado nega que isso tenha ocorrido e afirma que o Ministério Público imprime uma
fiscalização rigorosa.
Conseg
O único documento que a polícia apresenta sobre a reforma
é uma relação de material de
construção publicado no "Diário Oficial" do Estado em 18 de
janeiro de 2008 -a reforma
acabou em 29 de outubro de
2007. A lista é uma doação de
quase R$ 40 mil e tem apenas
parte do material necessário
para uma obra como aquela.
Além de ter sido publicado
no "Diário Oficial" após a conclusão da reforma, o material é
doado pelo Conseg (Conselho
Comunitário de Segurança) da
Saúde/Vila Clementino.
O próprio vice-presidente do
Conseg, o advogado Danilo Maso, admite que o conselho não
pode fazer doações. "O Conseg
não tem nem CNPJ", afirmou.
"O Conseg só faz o contato e pede aos empresários."
Maso disse ter arrecadado
parte do material a pedido do
delegado Sassi (o delegado nega). Disse não saber se todas as
empresas apresentaram notas
fiscais e se entre elas está alguma investigada pela fazendária.
"Eu acho que a grande maioria
[apresentou notas]. Não posso
colocar isso com certeza, mas
vai direto para eles [da Segurança]", afirmou.
A delegacia fazendária existe
justamente para que as notas
fiscais emitidas pelas empresas
sejam a expressão da verdade.
Nem a Segurança Pública nem
a Delegacia Geral da Polícia Civil apresentaram uma só nota à
Folha sobre a reforma.
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