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VÔO 1907
Pilotos negam ter desligado equipamento
Sistema anticolisão não estava funcionando no momento do acidente; ex-ministro da Justiça defenderá tripulação de jatinho
Pilotos reclamam do sistema de comunicação da região; dizem que não conseguiram contato com os radares do controle aéreo
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
Os pilotos do Legacy que derrubou o Boeing da Gol em colisão, Joseph Lepore e Jean Palladino, estão irritados com o
noticiário brasileiro e têm dito
a interlocutores brasileiros, aos
berros, que em nenhum momento apertaram qualquer botão ou tomaram qualquer iniciativa que pudesse desligar o
transponder do avião.
O transponder é a antena que
transmite dados do avião para o
controle de vôo, inclusive para
o sistema anticolisão, e estava
inoperante -desligado ou com
falha- no percurso entre Brasília e o local do acidente, na
serra do Cachimbo (MT).
Caso contrário, teria alertado
os pilotos e, mesmo que eles
não agissem, os sistemas de segurança dos dois aviões seriam
acionados automaticamente
para evitar o choque -que matou 155 pessoas, entre tripulantes e passageiros do Boeing.
Há duas possibilidades para
o transponder estar desligado:
ou foi desligado propositalmente ou teve problemas -um
mau contato, por exemplo, como especulam autoridades aeronáuticas. Nenhuma dessas
hipóteses está confirmada.
Os dois pilotos também fazem pesadas reclamações sobre as condições de vôo, especialmente de comunicação, na
região da serra do Cachimbo.
Dizem que houve sucessivas
tentativas de contato com os
radares de controle aéreo, sem
sucesso. Não especificaram se
foram antes ou após o acidente.
Efetivamente, a comunicação na região é muito fraca. As
duas freqüências em operação
pelo controle em Brasília não
funcionaram -os operadores,
após não notificar o Legacy sobre seu nível de vôo, que deveria ter sido reduzido de 37 mil
pés para 36 mil pés após passar
pela capital, tentaram sem sucesso falar com o jato.
Lepore e Palladino já deram
três depoimentos, um à Polícia
Civil de Mato Grosso, outro a
oficiais da Base Aérea da serra
do Cachimbo e o terceiro a especialistas em acidentes aeronáuticos da Base Aérea do Galeão, no Rio. Não podem deixar
o país e estão sendo ameaçados,
inclusive, de prisão caso se configure culpa pelo desastre.
A empresa norte-americana
ExcelAire, que comprou o Legacy, teme virar "bode expiatório" e decidiu sair da defensiva
e partir para a ofensiva, contratando o escritório do advogado
José Carlos Dias e a agência de
comunicação Burson-Marsteller, representada no Brasil por
Francisco de Carvalho.
Dias foi ministro da Justiça
(7/1999 a 4/2000) no gestão
FHC e ontem falou ao telefone
com o atual ministro, Márcio
Thomaz Bastos, e com o diretor-geral da Polícia Federal,
Paulo Lacerda, para tentar
amenizar o clima contra os
clientes e colocá-los à disposição "para qualquer esclarecimento". Velho amigo de Thomaz Bastos, o ex-ministro disse
que os pilotos estão no Rio e se
prontificaram a responder
quantas forem as dúvidas.
O temor dos dirigentes da
empresa americana é que se feche uma espécie de cerco contra os pilotos, sem que tenham
canais para se defender, tanto
na Justiça quanto na polícia e
na própria imprensa -que tem
afunilado as suspeitas de culpa
do acidente para o Legacy.
As grandes dúvidas que se
cristalizaram desde o acidente
são: 1) por que o transponder
do Legacy estava desligado; 2)
por que foi religado na hora do
choque com o outro avião; 3)
por que os pilotos não seguiram
o plano de vôo, que previa uma
mudança de altitude de 37 mil
pés para 36 mil pés a partir de
Brasília; 4) por que falhou a comunicação entre o Legacy e o
Cindacta-1 (o centro de controle de Brasília).
Os dois pilotos sobreviventes
são peças-chave para responder a essas dúvidas, que deverão ser esclarecidas com maior
precisão com a abertura das
caixas-pretas dos dois aviões.
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