São Paulo, quinta-feira, 06 de abril de 2000


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CRIME ORGANIZADO

Ex-chefe da Polícia Civil do Paraná é acusado de ligação com criminosos e diz que PM pode matá-lo

Foragido da CPI, ex-delegado teme morte


JOSÉ MASCHIO
Da Agência Folha, em Curitiba

O ex-delegado-geral da Polícia Civil do Paraná João Ricardo Kepes Noronha, 41, acusado pela CPI do Narcotráfico de comandar o crime organizado dentro da Polícia Civil do Estado, rompeu ontem o silêncio e falou, com exclusividade, à Agência Folha.
Foragido desde 2 de março, quando teve sua prisão decretada, ele afirmou que a CPI agiu no Paraná como um tribunal de exceção, "como nos tempos da Inquisição", não lhe dando chance de defesa. Disse que só irá aparecer depois que seus advogados conseguirem na Justiça a revogação de seu mandado de prisão.
Noronha afirmou também que recebeu informações de "dentro da PM" que a P-2 (polícia secreta da polícia paranaense) teria "ajustado" a sua morte em caso de ele decidir se entregar às autoridades.
O ex-delegado está sendo procurado pelas Polícias Civil, Militar e Federal. Concordou em falar com a condição de que não fosse informada sua localização.
Noronha recebeu a Agência Folha em uma sala espaçosa de um apartamento de classe média. Sua maior preocupação era não deixar ninguém passar perto da janela. Acompanharam a entrevista, além do ex-delegado, três pessoas (dois homens e uma mulher, que parecia ser a dona da casa).
Vestindo calça jeans e camisa branca, Noronha só se emocionou uma vez, quando falou que sente saudades de seus três filhos. Disse ter perdido 10 kg no último mês e estar aflito com a situação.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista que teve duração de quatro horas.

Agência Folha - O sr. é acusado de chefiar o crime organizado dentro da polícia paranaense. O que tem a dizer sobre isso?
João Ricardo Kepes Noronha -
É uma acusação absurda. Sou o delegado que mais prendeu policiais, civis e militares envolvidos com o crime no Paraná. Nunca respondi a nenhuma acusação ligada à área de entorpecentes. É absurdo que em uma investigação de dois, três dias eu seja apontado como um dos maiores criminosos do Paraná.

Agência Folha - E os depoimentos na CPI contra o sr.?
Noronha -
Os deputados da CPI estabeleceram um tribunal de exceção, dando credibilidade a pessoas condenadas. Agiu como nos tempos da Inquisição.

Agência Folha - Por que então o sr. fugiu?
Noronha -
As provas contra mim são provas ilícitas. Eu não iria me expor a uma execração pública. Não deram oportunidade nem sequer de eu prestar esclarecimentos. Com base em declarações de presos, de mascarados, do Neves (major da PM Waldir Copetti Neves), de uma presa, Shirley Pontes, que havia sido detida por mim, eles (os parlamentares integrantes da CPI) foram induzidos a pedir minha prisão sem me ouvir nem indiciar.

Agência Folha - Mas o sr. foi convocado pela CPI para prestar depoimento no dia 2 de março e não apareceu?
Noronha -
Meu depoimento era no dia 1º. Foi adiado para o dia 2, e eu soube, de dentro da Assembléia Legislativa, que estava combinado: "Vamos algemar ele, filmar, vamos fazer e acontecer". Eu não admiti essa situação.

Agência Folha - O sr. não vai se entregar?
Noronha -
Eu não compareci até agora porque a ordem de prisão se baseou em provas viciadas. Eu acredito na independência do Judiciário que irá, ao analisar tudo isso na hora certa, verificar que tudo foi uma grande armação, uma perseguição contra mim.

Agência Folha -O secretário de Segurança Pública do Paraná, José Tavares, disse que já existem provas de que o sr. participa do esquema de desmanche de veículos.
Noronha -
Essas investigações se assemelham aos tempos da Inquisição. Após provada minha inocência, serão tomadas medidas judiciais contra quem tentou me envolver com o crime.

Agência Folha - Neste período fugindo, por onde o sr. andou? Como foram esses dias?
Noronha -
Foram os piores 30 dias de minha vida. Longe da família, sei que até os amigos dos meus filhos foram proibidos de ir à minha casa. Nesse tempo eu fiquei fora do Estado. É para onde vou voltar até resolver minha situação. Consta -tenho fonte na própria PM- que a P-2 teria ajustado, o major Waldir Neves, a minha execução na hora da prisão, simulando uma reação.


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