São Paulo, domingo, 06 de abril de 2008

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Cai apoio à pena de morte, e país fica dividido

Pesquisa realizada em março mostra que 47% dos brasileiros votariam a favor de lei para restabelecer a pena capital

Índice representa queda de oito pontos percentuais em relação a levantamento realizado no ano passado, quando apoio era de 55%

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma pesquisa Datafolha sobre a pena de morte revela o quanto o apoio a esse tipo de medida extrema pode ser circunstancial e emotivo. No ano passado, logo após o assassinato do garoto João Hélio, 6, no Rio, 55% dos brasileiros apoiavam a adoção da pena de morte no país. Era a maior taxa desde 1993, quando um índice idêntico ao de 2007 foi apurado.
Levantamento realizado entre 25 e 27 de março mostra que esse índice tinha algo de volátil: 47% dos brasileiros votariam agora a favor de uma lei para restabelecer a pena de morte no país. A última vez que o Brasil aplicou legalmente esse tipo de pena foi em 1855.
Os 47% representam uma queda de oito pontos percentuais em relação ao ano passado. Declararam-se contra esse tipo de medida 46% dos entrevistados. Em março de 2007, 40% se diziam contrários.
O Datafolha entrevistou 4.044 brasileiros com 16 anos ou mais em 159 municípios. A margem de erro do levantamento é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos.
A pesquisa de março último mostra o quanto o tema divide os brasileiros: a diferença entre os que apóiam e os que são contrários à pena de morte é de um ponto percentual -ou seja, está dentro da margem de erro, o que indica uma situação de empate. No ano passado, quando o garoto João Hélio foi arrastado por um carro nas ruas do Rio, essa diferença era de 15 pontos.
Essa divisão sobre a pena de morte não era registrada em pesquisas do Datafolha desde 2003. Naquele ano, 49% se declararam a favor e 47% contra. Nas quatro pesquisas seguintes, a parcela de brasileiros a favor sempre superou os que eram contra a pena de morte.
Uma das maiores quedas do apoio à pena de morte ocorreu no segmento mais rico da sociedade -os que têm renda familiar mensal acima de dez salários mínimos. Nesse segmento, o apoio caiu de 64% em 2007 para 47% agora. Os que recusam esse tipo de medida cresceram na mesma proporção, de 34% para 51%.
Entre os mais pobres, cuja renda familiar mensal não passa de dois salários mínimos, a aprovação à pena de morte recuou oito pontos percentuais -foi de 52% para 44%.
Os mais pobres estão entre os que mais rejeitam a medida. O índice de 44% é o segundo mais baixo de apoio à pena. Só entre as mulheres ele é menor -43%.
O maior repúdio à adoção da pena de morte ocorre entre os que têm curso superior. É um dos poucos segmentos em que taxa de reprovação ultrapassa os 50% -é de 51%.
Outra queda expressiva de apoio à pena capital foi registrada entre os moradores da região Sul do país. Foi de 16 pontos percentuais -de 66% no ano passado para 50% hoje.
A pesquisa flagra a diferença de mentalidades entre os moradores das cidades do Rio e de São Paulo. Entre os paulistanos, 52% dizem apoiar a pena de morte. Já entre os cariocas, esse índice é nove pontos percentuais inferior, 43%.

Mais racionalidade
Dois pesquisadores de violência ouvidos pela Folha, o sociólogo Claudio Beato e a antropóloga Paula Miraglia, afirmam que o resultado da pesquisa aponta uma volta da racionalidade no debate da pena de morte. Ambos são contrários a essa medida.
Beato, professor da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), diz que chamou sua atenção a baixa adesão dos mais pobres à pena de morte.
"A população mais pobre parece perceber que já existe a pena de morte informal no Brasil, praticada pela polícia e por grupos de extermínio, e que isso não funciona", afirma.
Isso pode explicar, segundo Beato, porque os que têm renda familiar de até dois salários mínimos apóiam menos (44%) a pena de morte do que aqueles que ganham mais de dez salários mínimos (47%). Os mais pobres, de acordo com ele, convivem mais intimamente com a violência e sabem, empiricamente, que não há "soluções simplistas" para combatê-la.
Miraglia, diretora-executiva do Ilanud (Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para a Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente), afirma que o resultado da pesquisa acompanha uma percepção que ela tem sobre o debate na área de segurança:
"As pessoas já não acreditam em soluções mágicas", diz. Para ela, isso pode ajudar a entender por que os mais pobres e as mulheres estão entre os que mais rejeitam a pena de morte.
Sobre os mais pobres, ela tem uma hipótese para a rejeição da pena de morte: "Eles sabem que a Justiça se distribui de maneira desigual e os pobres iriam pagar o pato."
Já as mulheres, diz ela, rejeitam a medida porque historicamente são as maiores vítimas de violência e conhecem a ineficácia desse tipo de resposta.


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