São Paulo, domingo, 06 de abril de 2008 |
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GILBERTO DIMENSTEIN Renascidos das cinzas
UM PUNHADO DE alunos, pais e
professores na cidade de São
Paulo entrou, no final de
2004, numa batalha que, naquele
momento, parecia perdida: salvar a
sua escola pública, a Martim Francisco, cujo prédio tinha sido vendido
para uma construtora. Aprovada pela Câmara Municipal às vésperas do
recesso parlamentar, a venda teve a
participação do governo estadual e
da prefeitura. Olhando um detalhe da mais recente pesquisa Datafolha sobre as principais preocupações dos brasileiros, encontramos o início do círculo vicioso da ignorância. As três principais preocupações são, pela ordem, saúde, desemprego e violência. Quando levamos em conta a escolaridade e a renda do entrevistado, essa ordem muda. Para os mais ricos e com ensino superior, a educação está em segundo lugar (19%), depois da saúde (24%). Em terceiro, ficaria a violência (13%) e, em quarto, com muita distância, o desemprego (9%). Para os mais pobres e com menos escolaridade, a educação é um problema menor; aliás, quase não é um problema. Apenas 3% dos brasileiros com ensino fundamental apontariam a educação como o mais importante problema nacional. A tradução desses números é a seguinte: o rico, que coloca o filho na escola particular, está muito mais preocupado com a educação do que o pobre, que matricula o filho numa escola pública. Não é à toa que o governo tem de quase subornar as famílias mais carentes para que deixem seu filho estudando. Se os pobres pensassem como os ricos e soubessem enxergar melhor a relação entre prosperidade individual e qualidade de ensino, a lista do Enem geraria uma gritaria em todo o país. As direções das escolas particulares aguardam com extrema ansiedade os resultados do Enem pelo simples motivo de que a posição no ranking significa dinheiro. Os pais avaliam se a mensalidade está valendo a pena, comparando as notas com as mensalidades, muitas das quais, nas escolas de elite, ultrapassam R$ 2.000 -mais de dez vezes o custo mensal de manter um estudante em uma escola pública. Os proprietários dos estabelecimentos terão de explicar a relação custo-benefício entre a nota e o valor da mensalidade. Se as explicações não forem convincentes, perdem alunos e são vítimas do marketing viral do boca-a-boca. As instituições que estão no topo do ranking beneficiam-se do círculo virtuoso em que, por serem boas, atraem as famílias mais preocupadas com a formação de seus filhos e, como atraem os melhores alunos, apresentam os melhores resultados. Quando há problemas, convocam-se professores particulares, psicólogos e psicopedagogos. Por isso as escolas técnicas ou militares, embora públicas, conseguem se destacar. É simplesmente inimaginável que, numa escola particular, os professores faltem cronicamente, algo tolerado pelas famílias que têm seus filhos na escola pública e justificado pelos sindicatos. Não me canso de repetir que uma imensa porcentagem de alunos não aprende porque não recebe os mais elementares cuidados de saúde física e mental, além de terem poucos estímulos culturais. Na semana passada, um estudo da Fundação Getúlio Vargas mostrou que crianças e jovens que vivem em casas com saneamento básico ruim têm mais problemas escolares porque tendem a ficar mais doentes. É impossível fazer uma comparação entre escolas públicas e privadas sem levar em conta uma série de fatores sociais, a começar da atenção familiar -o ambiente de casa é a primeira sala de aula. PS - A escola Prof. Antonio Alves Cruz estava ameaçada de fechar as portas por falta de alunos e debandada de professores. Aquela crise motivou pais, alunos e ex-alunos, que criaram um movimento chamado Fênix, numa referência à ave mitológica que renasceu das cinzas. Na lista do Enem, o colégio ficou em 11º lugar entre as melhores escolas estaduais da cidade de São Paulo. Coloquei em meu site (www.dimenstein.com.br) mais casos bem-sucedidos da relação da escola com a comunidade.
gdimen@uol.com.br |
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