São Paulo, sábado, 06 de julho de 2002

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TRANSPORTES

Motoristas e cobradores temem desemprego devido ao novo modelo proposto pela SPTrans em licitação

Quebra-quebra impede audiência pública

ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

Um quebra-quebra liderado por motoristas e cobradores de ônibus impediu ontem a realização da audiência pública que iniciaria os procedimentos de licitação do novo modelo de transporte coletivo em São Paulo.
O auditório Elis Regina, no Palácio de Convenções do Anhembi, que dispõe de 850 lugares sentados, teve cadeiras, mesas e banheiros destruídos. Mais de 1.300 participavam do evento, entre empresários, perueiros e principalmente condutores de ônibus.
O secretário municipal dos Transportes, Carlos Zarattini, não chegou a falar nem cinco minutos sobre as regras da concorrência.
Ele e Carlos Alberto Carmona, presidente da SPTrans (São Paulo Transporte), tiveram que sair correndo do auditório após serem atingidos por um jato de pó químico de um extintor de incêndio, acionado por um manifestante que estava com os motoristas.
Representantes da categoria subiram em cima do palco, de onde jogaram latinhas de cerveja, mesas e cadeiras e rasgaram as cortinas. O telão utilizado para a apresentação também foi derrubado. Não havia seguranças no auditório no momento do tumulto.
A ação foi classificada por Zarattini como um "ataque fascista". O secretário prometeu tomar medidas judiciais e disse que, além da intenção eleitoral de prejudicar a administração Marta Suplicy, houve interesses de parte dos empresários no protesto.
"Temos certeza de que há participação de empresários incentivando a manifestação. Algumas empresas liberaram seus empregados para participar dela", afirmou Zarattini, sem citar diretamente os nomes das viações. "Uma parte dos empresários resiste a mudanças e busca criar problemas."
Edivaldo Santiago, presidente do sindicato dos condutores, que é ligado à Força Sindical e a parlamentares do PSDB, negou que a ação violenta tenha sido iniciada pelo grupo de trabalhadores.
O clima de tensão foi formado antes mesmo de começar a audiência pública. Zarattini havia se reunido horas antes com Santiago, mas não sabia da presença dos motoristas no Anhembi.
A apresentação estava marcada para as 14h30. Só começou às 15h15, depois de uma reunião do secretário com técnicos do governo petista para decidir qual seria a postura durante a audiência.
A mesa do palco tinha oito lugares disponíveis, mas só foi ocupada por Zarattini e Carmona. A intenção era evitar desgaste dos demais funcionários da prefeitura.
Os dois entraram no auditório e foram recebidos com vaias e centenas de cartazes, distribuídos pelos condutores, com a inscrição "Secretário Trapalhão". Enquanto a cerimônia era iniciada por um locutor, Zarattini e Carmona eram atingidos por dezenas de bolinhas de papel. O secretário municipal começou a falar sobre a licitação, sem responder aos manifestantes, ao mesmo tempo em que um homem embriagado dançava em cima do palco, de frente para ele.
Por volta das 15h20, houve a interrupção do evento. Além da destruição de parte do auditório Elis Regina, um cinegrafista contratado pela prefeitura foi agredido e teve seu equipamento e seu celular roubados.
Edivaldo Santiago disse que a manifestação foi organizada porque a implantação do novo modelo de transporte significaria a retirada de 2.500 da frota atual de 10 mil ônibus, resultando no desemprego de 11 mil condutores.
"A nossa intenção é evitar que a audiência seja realizada. A prefeitura precisa discutir antes com os trabalhadores", afirmou Santiago, minutos antes do tumulto.
Ele também criticava a intenção da prefeitura de retirar de circulação, a partir de hoje, 301 ônibus que não passaram em vistorias.
O secretário dos Transportes negou que seu projeto leve à redução da frota. Ele disse que apresentaria um modelo com a existência de 11 mil ônibus do padrão atual, com cerca de 70 lugares. No final de 2001, havia manifestado a intenção de manter 9.500.
"O Edivaldo poderia ter se informado melhor. Ele nem quis ver a audiência pública para saber", disse Zarattini. "No futuro, haverá mais ônibus articulados, maiores, podendo haver menos que 11 mil. Mas a migração da frota atual para uma frota maior se dá lentamente. E a quantidade de horas que eles vão circular será maior. O emprego está garantido."
A nova licitação do transporte coletivo prevê a divisão da cidade em linhas locais (que circularão entre os bairros), estruturais (que ligarão os bairros ao centro) e centrais (que ficarão restritas ao centro). Hoje, as viações operam em contratos emergenciais, que vencem no final deste mês e serão renovados por mais seis meses.
O diretor jurídico do Transurb (sindicato das empresas de ônibus), Antonio Sampaio Amaral Filho, disse, minutos depois do quebra-quebra, que concordava com a preocupação dos trabalhadores. "É triste ter acontecido esse tumulto, mas a gente sabe que é um tema apaixonante. Existe certa dose de preocupação, é um problema social", afirmou.
O Transurb não foi localizado depois das 18h30 para comentar as acusações de Zarattini. A Folha deixou recado no celular do assessor de imprensa da entidade, mas não obteve resposta.



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