São Paulo, sábado, 06 de setembro de 2008

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Exército pressiona, e juiz é tirado do caso Providência

Para Comando Militar do Leste, magistrado tratou tenente e praças de maneira desrespeitosa e vexatória durante interrogatórios

RAPHAEL GOMIDE
DA SUCURSAL DO RIO

O comandante do Comando Militar do Leste (CML), general-de-exército Luiz Cesário da Silveira Filho, foi ao presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, Castro Aguiar, reclamar do juiz Marcello Granado e pedir seu afastamento do processo do morro da Providência, no Rio.
Convocado pelo TRF para atuar em segunda instância em substituição a uma juíza do tribunal -em espécie de promoção temporária-, Granado não se ocupa mais do processo.
Em 14 de junho, três jovens da Providência (centro) foram assassinados, após terem sido presos e entregues por 11 militares do Exército a traficantes do morro da Mineira (zona norte). A Força atuava na favela no projeto Cimento Social (reforma de fachadas de casas), do senador e candidato a prefeito do Rio Marcelo Crivella (PRB).
O TRF confirmou que o general Cesário -comandante das tropas do Exército no Rio, em Minas e no Espírito Santo- se reuniu com Castro Aguiar duas vezes para tratar do tema "Providência". A primeira, em 20 de junho, ao lado do ministro da Defesa, Nelson Jobim; a segunda, em particular.
O presidente do TRF, por meio da assessoria, afirmou que não comentaria o caso. O CML também não comentou.
A Folha apurou que o comando do CML ficou incomodado com a forma de Granado conduzir os interrogatórios dos militares. Na visão do alto escalão do Exército no Rio, o tenente e os praças denunciados pelo Ministério Público Federal estavam sendo humilhados e expostos à imprensa pelo juiz, em audiências públicas, filmadas e fotografadas. Cesário estava em Portugal no auge da crise.
Quando voltou, foi ao TRF.
O estilo do juiz é, em sua própria definição, "franco" e "direto", de quem "mostra o que está pensando". Em vários momentos dos interrogatórios com os 11 militares, foi irônico ou incisivo, pressionando os acusados com perguntas duras e demonstrando que não acreditava nas explicações apresentadas. Também criticou o Exército indiretamente.
Granado não está mais no processo. Após tirar férias -segundo ele, já programadas- atua como juiz convocado do TRF. O juiz substituto da 7ª Vara Criminal Federal (da qual Granado é titular), Erik Navarro Wolkart, assumiu o caso.
O Ministério Público Federal e o juiz Granado negam que a substituição tenha ocorrido por pressões do CML. Granado afirmou que, antes de ser designado para o caso, já tinha sido consultado pela juíza do TRF Maria Helena Cisne sobre a disponibilidade de substituí-la, porque ela estaria no Tribunal Regional Eleitoral até o fim das eleições. "Não tem o menor cabimento", disse.
Para o MPF, Granado -ex-defensor público- pode até ser considerado um juiz mais favorável à defesa do que o novo responsável pelo caso, Erik Wolkart, considerado "mais rígido". De acordo com um integrante do MPF, os advogados de defesa preferem Granado.
A Folha falou por telefone e enviou e-mails às assessorias de imprensa do TRF e do Comando Militar do Leste, perguntando especificamente sobre o pedido do general para afastar o juiz do caso.
Nenhuma das duas instituições negou o fato. O tribunal informou que seu presidente, Castro Aguiar, não comentaria o caso e sugeriu que o repórter consultasse o CML, que pediu a audiência. A seção de comunicação do CML informou que o comandante Cesário não falaria sobre o episódio.


Colaborou SERGIO TORRES, da Sucursal do Rio


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