São Paulo, domingo, 06 de novembro de 2005

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ROMEU E JULIETA

Segundo empresa que registra recordes no Brasil, união é a mais longa do país; famílias do casal eram rivais

Casal em MG ultrapassa os 73 anos de união

Jefferson Coppola / Folha Imagem
Seu Raul e dona Carlininha, que têm o casamento mais longo do país; eles vivem no sul de Minas


DANIELA TÓFOLI
ENVIADA ESPECIAL À ANDRELÂNDIA

Daquela vez, os Caranguejos venceram os Veados. Deu frio na barriga, mas Raul de Andrade Carvalho, tomado de um tipo de certeza absoluta que só se tem aos 24 anos, respirou fundo, sentou e escreveu: "Deliberando em tomar estado e tendo verdadeira simpatia, amizade e admiração por sua digna filha senhorita Carlininha, vou por esta, de acordo com todos de minha família, solicitar o vosso apoio e consentimento...".
E por aí foi até concluir a carta com o pedido de casamento endereçada à família de Carlina de Azevedo, filha do fundador dos Veados, grupo político de oposição aos Caranguejos, fundado pelo pai de Raul. A data era 16 de novembro de 1931, e o local, Andrelândia, uma cidadezinha colonial no sul de Minas Gerais.
A história a la Romeu e Julieta teve final feliz. Raul e Carlina se casaram em 1932 e continuam juntos até hoje. Ela com 99 anos, e ele, com 97. De casamento são 73, o mais longo do país.
Nem tudo, porém, foi tão simples assim. Após mandar a carta, quase um mês havia se passado e nada da resposta. Raul, que teve de convencer a família que morreria de amor se não o deixassem se casar com a rival, não sabia que a dona Carlina, mãe de Carlininha, estava escrevendo para seus outros 11 filhos, que moravam espalhados pelo Brasil, perguntando se devia aceitar o pedido.
Carta vai, carta vem, a família Azevedo resolveu permitir o matrimônio e, em 12 de dezembro, o jovem Caranguejo recebeu a resposta: "...estamos de acordo, não só eu como os meus filhos. Peço a Deus para que sejam muito felizes e se esforcem ambos para fazerem a felicidade um do outro...".
Os pedidos de dona Carlina-mãe foram atendidos por Deus. A felicidade começou no dia do casamento, primeiro a ser realizado na igreja matriz da cidade, em 4 de maio de 1932, e continuou na lua-de-mel, no Rio de Janeiro.
"Aquele foi o dia mais feliz da minha vida. A Carlininha estava uma beleza vestida de noiva", lembra seu Raul, prefeito por duas vezes, provedor da Santa Casa e delegado em Andrelândia ("ser delegado foi meu pior cargo, a gente só trabalha com a infelicidade dos outros", conta).
Ainda hoje, às vésperas de completar bodas de brilhantes, o casal se comporta como se fosse um jovem par de namorados.
Inseparáveis (nunca ficaram mais de uma semana um longe do outro), trocam carinhos e elogios. Só não podem mais cruzar os salões de baile da cidade dançando tango nem sair para viajar de trem, já que Carlina está com artrose e perdeu boa parte da audição e Raul operou da catarata. Mas ainda dividem os acontecimentos do dia e fazem companhia um ao outro.
Toda tarde, quando Raul se senta para a sagrada partida de buraco com alguns dos sete filhos, 26 netos e 36 bisnetos, dona Carlina-filha fica na sala com o marido. "Para o casamento durar, tem que ter conversa. E a gente também rezava um terço toda noite, antes de ir para cama. Estes são os segredos para uma vida boa", diz Raul. "Hoje, as pessoas casam sem gostar e se separam na primeira briga. Não tem amor nem companheirismo."
O matrimônio, segundo a RankBrasil (empresa que registra os recordes no país) é o mais longo do Brasil com documentação comprovada. As alianças ainda estão nos dedos dos dois, com a inscrição do dia do casamento. "Em todos esses anos, não me arrependi nem um dia da minha vida de ter me casado com ela."


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