São Paulo, sexta-feira, 07 de maio de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

BARBARA GANCIA

Sigam-me os chatos, mas em silêncio


A regra é simples: o que você não faria no boteco, na vida ou jantando com sua avó, não faça nas redes sociais

Quando usam o termo "cheinha" para me definir, sei que estão pensando "gorda, sedentária sem um pingo de força de vontade".
Da mesma forma, quando a rede social Facebook me informa que tenho 1.600 "amigos", não sou batráquia a ponto de imaginar que um eufemismo modificou meu status social do dia para a noite.
Está certo que, nos últimos tempos, não tenho empenhado grande esforço no sentido de cultivar as poucas amizades, entre mortas, feridas e perdidas para sempre, que me restam. Mas, o que posso fazer se realmente acho bem mais divertido brincar com meu iPhone a ouvir as mesmas conversas chatas ao redor da mesa?
Não cola para mim esse papo naturalista com cheiro de chuva de que quem atende ao celular ou responde a um SMS enquanto está com amigos desconsidera as pessoas. Se, em vez de estar ao celular, o amigo entrasse no restaurante, ele deveria ser ignorado? Do outro lado da máquina há sempre uma multidão, estamos apenas diante de uma nova forma de relacionar.
Eu, por exemplo, prefiro mil vezes o Twitter ao Facebook. Adaptei-me melhor. No Twitter as pessoas são obrigadas a ter uma certa celeridade, a responder em tempo real. Quem fica com lero-lero dança.
E eu não sei o que é, se meus conhecidos de FB são todos bocós, analfabetos e reacionários, mas um dos aspectos mais dolorosos do site para mim foi descobrir que ninguém entende minhas piadas.
Verdade. Resolvi fazer uma brincadeira com o conceito de amizade do site e escrevi no mural: "1.600 "amigos" no FB e ninguém pra me acompanhar na colonoscopia..."
É evidente que, se eu realmente estivesse indo fazer o incômodo exame desacompanhada, a última coisa que me viria em mente seria contar isso para o mundo inteiro num site de relacionamento. Mais fácil que eu me escondesse debaixo da cama e chorasse o dia todo.
Pois bem, isso foi há dois dias e desde então não faço outra coisa senão receber ofertas de gente que nunca vi mais gorda querendo ir comigo a um exame que não existe. Sei que a solidariedade é linda e coisa e tal, mas será que ninguém para, respira e pensa antes de escrever?
Porque a caixinha de comentários está ali ao alcance dos dedos, não quer dizer que ela deva ser usada. Tecnologia ou não, continua a existir uma coisa chamada dignidade.
Teve também um tipo no Twitter. Eu proseava com mestre Silvio Luiz sobre sei lá que jogo do São Paulo e o rapaz entrou no meio. Perguntei-lhe se a mãe dele não o tinha ensinado que se intrometer na conversa dos outros é horrível. Ele respondeu: "Mas aqui é território livre, a gente fala o que quer".
A meu ver, a regra é simples: o que você não faria no boteco, na vida ou jantando com sua avó, não faça na web. Se não tem intimidade com a pessoa, não se ofereça para ir vê-la se contorcer depois de tomar laxante. Dentro ou fora do Facebook.
Se eu estivesse falando com o Silvio Luiz à mesa do restaurante, você entraria na conversa? Não. Então é não no Twitter também. Acompanhar a conversa em tempo real já não está de ótimo tamanho?
Não me incomodo de ser seguida por trogloditas no Twitter e no Facebook. Contanto que eles o façam em silêncio.

barbara@uol.com.br

Twitter:@barbaragancia


Texto Anterior: Análise: Automedicação não é a maior vilã do sistema de saúde
Próximo Texto: Qualidade das praias: Mongaguá e Praia Grande têm a maioria das praias impróprias
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.