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QUESTÃO DE PRIORIDADE
Armados e uniformizados, policiais de elite foram deslocados para evento esportivo no Ibirapuera
Polícia anti-seqüestro faz segurança de luta
LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL
MARLENE BERGAMO
REPÓRTER-FOTOGRÁFICA
Durante as cinco horas e 33 minutos em que o ginásio do Ibirapuera foi cenário do 4º Showfight,
"o maior torneio de artes de combate da América Latina", pelo menos oito investigadores armados e
com os uniformes negros da DAS
(Delegacia Anti-Seqüestro) deixaram suas tarefas para "fazer a
segurança de lutadores e platéia",
conforme disse à Folha um dos
policiais. A Secretaria da Segurança Pública de São Paulo afirma em
seu site que, nos últimos três meses de 2005, ocorreram 22 casos
de seqüestro só na capital.
O investigador entrevistado falou diante de seus colegas (que assentiam com a cabeça) que estava
no local "por gosto pelas lutas" e
porque foi "oficiado" pelo delegado Antonio Assunção de Olim, da
DAS. No jargão, "ser oficiado"
significa "ser designado oficialmente para uma função".
Segundo o mesmo agente, havia
80 policiais civis "atuando na segurança" do ginásio do Ibirapuera -15 dos quais uniformizados.
Além dos investigadores da DAS,
a Folha fotografou dois carros oficiais do GER (Grupo Especial de
Resgate) e um do GOE (Grupo de
Operações Especiais), divisões especializadas da Polícia Civil, assim como a DAS. Ao término do
evento, os veículos saíram lotados
de policiais do estacionamento
em frente ao portão 11.
O empresário Oscar Maroni Filho, 51, idealizador do Showfight,
é também proprietário do clube
privê Bahamas, um dos maiores
prostíbulos de luxo da cidade.
"Mulher e artes de combate têm
tudo a ver", disse ele no celular
com número finalizado em 6969,
"uma brincadeirinha".
Em oito oportunidades, nos intervalos entre as lutas, Maroni homenageou o agora ex-governador
Geraldo Alckmin (PSDB), "sem o
qual esse evento não teria sido
possível". Ontem, em entrevista
gravada, repetiu ter recebido "todo o apoio do governo". Segundo
ele, do então secretário de Esporte
e Lazer do Estado de São Paulo,
Lars Grael, conseguiu prioridade
na reserva do ginásio do Ibirapuera e divulgação. A locação do ginásio saiu-lhe por R$ 22 mil.
Os contatos com a Secretaria da
Segurança Pública iniciaram-se
há 40 dias, quando o promotor
das lutas foi recebido por um assessor do secretário Saulo de Castro Abreu Filho na sede do órgão.
Na ocasião, disse Maroni, conseguiu apoio em troca de abrir
"escolinhas de artes de combate"
para ensinar garotos pobres a
"administrar sua agressividade
dentro do respeito às regras e à
hierarquia". "Vamos abrir essas
escolas em unidades da Febem e
onde mais for possível", disse.
O empresário não mencionou
quantos policiais foram empregados na segurança do Showfight.
Mas enfatizou que o contingente
empregado restringiu-se a homens do pelotão de choque da
PM, que ficaram na área externa.
"Os policiais civis estavam lá apenas se divertindo. Eu mesmo distribuí convites para eles." Além
dos agentes públicos, foi contratada uma empresa privada, que enviou 150 "armários" vestidos com
ternos negros ao Ibirapuera.
Para entender o realce do quesito "segurança", é só imaginar a
cena: cerca de 8.000 pessoas na
platéia (a maioria praticantes de
lutas como jiu-jítsu, boxe, muay
thai, caratê, submission), torcidas
organizadas com até 500 fortões
desses (representando as academias em que treinam) e, no ringue, superfortões se batendo.
Um exemplo: a terceira luta, de
muay thai -o boxe tailandês-,
entre Luis Sorriso e Moisés Gibi,
acabou quando Gibi soltou um
pontapé forte na cabeça de Sorriso, que jazia no chão, já fora de
combate. A deslealdade do lutador não ficou por isso mesmo.
Aos gritos de "Gi-bi, vai tomar no
c., Gi-bi, vai tomar no c.", as arquibancadas começaram a descer. Peitos inflados, como quem
marcha para a guerra, os homens
invadiram o ringue. Por pouco
não virou uma pancadaria.
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