São Paulo, terça-feira, 08 de julho de 2008

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Morre criança metralhada em ação policial

Testemunhas e a mãe dizem que PMs dispararam mais de 16 tiros em direção ao carro dela; eles alegam que houve um tiroteio

PMs perseguiam Stilo preto, mas carro alvejado era um Palio Weekend grafite; PMs levaram as mãos à cabeça ao ver erro, dizem testemunhas


Reprodução
João Roberto (à esq.), 3, morto após ser metralhado em operação policial, em foto com o irmão

SERGIO TORRES
LEANDRO FORTINO
DA SUCURSAL DO RIO

LUISA BELCHIOR
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA ONLINE, NO RIO

Metralhado na nuca em uma operação policial, João Roberto Amorim Soares, 3, morreu ontem no Hospital Copa D'Or (zona sul do Rio). Policiais são acusados de disparar pelo menos 16 tiros no carro da família do menino na noite de domingo.
Dois PMs foram presos. Eles alegam que trocavam tiros com ladrões de um Fiat Stilo preto, a quem perseguiam, e negaram ter atirado em direção ao carro em que estava João.
"Foi uma ação desastrosa, que demonstrou falta de preparo psicológico e operacional", afirmou o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame.
A versão dos PMs de tiroteio é contestada por testemunhas ouvidas no local (rua General Espírito Santo Cardoso, na Tijuca) pela Folha e pela mãe da vítima, Alessandra Amorim Soares. Ela disse ao marido, o motorista de táxi Paulo Roberto Soares, que os policiais atiraram no carro que ela dirigia, um Palio Weekend grafite, assim que encostou na calçada.
Pelo relato da mãe, um carro preto passou por ela em alta velocidade quando se aproximava do prédio em que vive a família. Em seguida, ainda segundo ela disse ao marido, ao ouvir a sirene policial, deduziu que havia uma perseguição e deu passagem à patrulha da PM. Foi quando os policiais começaram a disparar contra o carro dela, que tem os vidros cobertos por película escura.
No banco de trás, estavam os irmãos João Roberto, e Vinícius, de nove meses.
Segundo o marido, mesmo ferida por estilhaços na barriga e pernas, Alessandra abriu a janela e jogou a bolsa infantil que carregava, para mostrar aos PMs que conduzia crianças. Os policiais ainda gritaram: "Cadê o bandido? Cadê o bandido?". Foi quando ela saltou do Palio, abriu a porta traseira, pegou o corpo do primogênito, estendeu-o no chão e repetiu para os policiais, duas vezes: "Vocês mataram meu filho", de acordo com o relato feito ao marido.
Testemunhas contaram que os policiais levaram as mãos à cabeça ao perceber o erro.
O menino foi socorrido pelos bombeiros, que o levaram ao pronto-socorro mais próximo, o do hospital do Andaraí. O caçula escapou ileso dos tiros.
Após uma cirurgia craniana para retirar sangue que se acumulara, João Roberto foi transferido para o Copa D'Or, onde, ainda de madrugada, o seu coração parou por 25 minutos.
Os médicos conseguiram ressuscitar o menino, mas exames neurológicos realizados de manhã e à tarde registraram a morte cerebral. João Roberto só permanecia vivo porque tinha o organismo ligado a aparelhos. Às 16h30, morreu.
Além da bala que entrou pela nuca e atravessou o cérebro até a região frontal da cabeça, onde parou, o menino levou um tiro nas nádegas e outro de raspão na orelha esquerda.
Os médicos disseram logo cedo ao casal que estudasse a possibilidade de doar os órgãos do filho, já que não viam possibilidade de salvamento. À tarde, o hospital informou que o casal concordou com a doação.


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