São Paulo, segunda-feira, 09 de abril de 2007

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Nova Lei de Crime Hediondo permite liberdade provisória

Texto sancionado por Lula restituiu ao réu o direito de aguardar o julgamento em liberdade

Deputados admitem falha na votação da proposta, que endureceu os critérios para a progressão de pena nos crimes hediondos

GILMAR PENTEADO
DA REPORTAGEM LOCAL

A recente mudança na Lei de Crimes Hediondos, votada às pressas no Congresso Nacional para dar uma resposta ao clamor popular pelo endurecimento da legislação penal, aprovou uma antiga reivindicação de setores mais progressistas sem que boa parte dos parlamentares percebesse isso.
A nova lei, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no último dia 28, endureceu os critérios para a progressão de pena nos crimes hediondos (como transferência do regime fechado para um mais brando, como o semi-aberto). E retirou a proibição da concessão de liberdade provisória para acusados por esses crimes.
O texto, aprovado na Câmara e no Senado, restituiu legalmente ao acusado de crime hediondo o direito de esperar o julgamento em liberdade, caso preencha os requisitos -não represente risco à sociedade ou à realização do processo e não apresente perigo de fuga.
Com a mudança, juízes não têm mais nenhum impedimento legal se quiserem conceder a liberdade provisória. Mas a concessão não será automática. Vão avaliar caso a caso, como fazem nos crimes comuns.
A mudança na lei ocorreu sem debate público e surpreendeu integrantes do Judiciário. Setores que defendiam o endurecimento começam a reagir contra a medida que, para eles, traiu o espírito da alteração da lei. Defendem adendo na nova lei para anular a mudança.

Votação com urgência
A proposta de mudança da Lei de Crimes Hediondos era uma sugestão do governo federal, mas estava parada no Congresso desde o começo de 2006. Após a morte do menino João Hélio Vieites, arrastado e morto por criminosos no Rio, o projeto de lei foi resgatado e votado em regime de urgência.
O maior rigor na progressão de regime para os crimes hediondos dominou o debate -pela nova lei, o regime pode ser abrandado se o preso cumprir pelo menos 2/3 da pena, se for primário, e 3/5 se for reincidente. Antes, a lei vetava progressão, mas o benefício acabava sendo concedido após o cumprimento de 1/6 da pena.
A retirada da proibição da liberdade provisória, presente na proposta original do governo, nem sequer foi discutida.
Em 14 de fevereiro, uma semana após a morte de João Hélio, a Câmara aprovou a lei em meio a aplausos e discursos entusiasmados. A votação foi simbólica (sem registro nominal de votos), sem votos contrários.
O deputado federal Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), autor do pedido de urgência, admite que houve uma falha na análise do projeto. Apesar de se dizer contrário à concessão de liberdade provisória para esses acusados, votou favorável à proposta.
"Não cabe [a liberdade provisória] porque o crime hediondo tem um agravante. Percebeu-se posteriormente essa falha na análise. Em algumas votações, corre-se o risco de o relator ser o senhor absoluto."
Segundo o deputado federal José Eduardo Cardozo (PT-SP) -partido do governo-, relator do projeto no plenário, nenhum parlamentar o questionou sobre a retirada da proibição da liberdade provisória.
O texto suprimiu o termo "liberdade provisória" do inciso II do artigo 2º da lei, mas só se percebe isso ao confrontar a nova redação e a anterior.

Justificativa clara
Cardozo, que diz ter votado conscientemente a favor da medida, diz que a justificativa que acompanhava o projeto do governo era clara. O objetivo era se adequar ao entendimento de instâncias superiores do Judiciário. "O texto já tramitava havia algum tempo e a justificativa estava claríssima."
O deputado Antonio Carlos Pannunzio, líder da bancada do PSDB, disse que a principal discussão era a progressão de regime e afirmou não se lembrar se o item sobre a liberdade provisória foi discutido em plenário.
Ele é contra liberdade provisória para suspeitos de crimes hediondos presos em flagrante e favorável à liberdade até o julgamento em primeira instância se essa situação não existir.


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