São Paulo, quinta, 9 de abril de 1998

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JOGO
Temor do Fisco é que lei, se aprovada, não tenha regulamentação adequada
Cassino pode ser "máquina" de lavar dinheiro, diz Receita

DENISE CHRISPIM MARIN
enviada especial a Belo Horizonte

A Receita Federal concluiu que o projeto de lei que libera os cassinos no Brasil, aprovado em março pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, não impõe barreiras para sua utilização na lavagem de dinheiro do narcotráfico e de outras atividades ilícitas.
"O projeto de lei é leniente quanto à prevenção de lavagem de dinheiro por meio de cassinos", concluiu o Relatório Especial sobre Riscos da Lavagem de Dinheiro, ao qual a Folha teve acesso.
O texto foi elaborado pela Copei (Coordenadoria de Pesquisa e Investigação), a chamada equipe de "inteligência fiscal", e encaminhado ao secretário da Receita Federal, Everardo Maciel.
O temor do Fisco é que, uma vez aprovada pelo Congresso e sancionada, a nova lei não conte com regulamentação adequada. Ou seja, com regras práticas de controle do capital que circulará nos cassinos e de seus funcionários, dirigentes e proprietários.
A situação atual, sem os cassinos, já assusta o Fisco. Dados do IRS (Internal Revenue System), a Receita Federal norte-americana, mostram que US$ 450 bilhões em moeda "suja" circulam no Brasil a cada ano. A instituição ainda calcula que 17% dos depósitos bancários dos cartéis da droga estão concentrados no país.
Segundo o coordenador-geral da Copei, Deomar de Moraes, o projeto de lei favorece a lavagem de dinheiro por quatro motivos: permite a instalação de um cassino por unidade da federação antes da regulamentação da lei; não limita a atividade apenas a hotéis, que, do ponto fiscal, são considerados empreendimentos com um mínimo de solidez; deixa para a regulamentação a adoção de regras de controle; não há menção ao cumprimento da lei de lavagem de dinheiro.
De acordo com o relatório, os cassinos são alvos fáceis de setores interessados na lavagem de dinheiro por oito motivos:
1) O meio de troca é o dinheiro em espécie. O jogador pode, por exemplo, entrar no cassino com R$ 1.000 obtidos em atividades ilícitas e perder R$ 100 na roleta. Ao sair, poderá alegar que os R$ 900 restantes foram ganhos nos jogos;
2) Os cassinos fornecem alguns serviços similares aos dos bancos (conta de depósito, câmbio de moedas, troca de cheques, transferência eletrônica para instituição financeira, crédito);
3) Há rapidez nas operações que envolvam dinheiro;
4) São equipados para lidar com grandes transações de dinheiro;
5) Fichas de jogos e dinheiro são intercambiáveis;
6) Os clientes podem permanecer anônimos, segundo o projeto de lei;
7) Procedimentos internos podem ser abrandados para clientes considerados importantes;
8) O cassino com estabelecimento em outros países pode transferir recursos ao exterior.
Para contornar a ausência de barreiras à lavagem de dinheiro em cassinos, o relatório da Copei sugere que essas casas e seus responsáveis estejam sujeitos às penalidades previstas na lei de lavagem de dinheiro e recebam tratamento similar ao dado às instituições financeiras.
Assim, os proprietários e os cassinos também seriam submetidos à fiscalização do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), ainda não regulamentado.



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