São Paulo, quarta-feira, 09 de junho de 2004

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SAÚDE

Empresa é condenada a pagar indenizações em dois casos; valor pode chegar a R$ 2 milhões caso sentenças sejam confirmadas

Souza Cruz perde em ações de ex-fumantes

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

A Souza Cruz foi condenada por dois tribunais brasileiros a pagar indenizações por danos morais e materiais a ex-fumantes. Os valores das indenizações, se confirmadas em outras cortes, podem ultrapassar R$ 2 milhões.
No Rio Grande do Sul, o Tribunal de Justiça, uma corte de segunda instância, mandou a fábrica de cigarros indenizar em R$ 500 mil a família do ex-fumante José da Silva Martins, que morreu no ano passado. A Souza Cruz terá de pagar mais R$ 41.586,00, para ressarcir gastos da família Silva Martins com médicos.
A empresa foi condenada pela 6ª Vara da Câmara Cível do Tribunal de Justiça a pagar os salários que Silva Martins deixou de receber entre 2001, quando foi demitido por causa da doença que contraíra, e a sua morte, no ano passado.
Em 1992, médicos diagnosticaram que ele tinha enfisema pulmonar. Silva Martins informou que começara a fumar aos 16 anos e por mais de 50 anos consumiu marcas fabricadas pela Souza Cruz, como Hollywood, Continental e Minister.
O juiz convocado José Conrado da Silva usou o Código de Defesa do Consumidor para justificar sua decisão, tomada no último dia 2: "A Souza Cruz ignorou, desde a sua origem, a necessidade de informar detalhada e ostensivamente a composição e os riscos do produto". Em primeira instância, o pleito do ex-fumante fora rejeitado.
José Carlos Ribeiro Garcia, 49, advogado do ex-fumante, disse que prevaleceu a tese de que a indústria do cigarro recorreu à propaganda enganosa. Em 1945, quando seu cliente começou a fumar, a Souza Cruz não falava sobre os riscos do produto.
Os alertas nos maços foram introduzidos em 1992. O pneumologista Mário Rigatto (1928-2000), um dos pioneiros nas pesquisas sobre cigarro, disse em depoimento na ação que quem fazia o alerta no maço era o Ministério da Saúde, não a indústria.
No mesmo dia, a 9ª Câmara do TJ do Rio Grande do Sul rejeitou uma ação semelhante. O desembargador Pedro Celso dal Prá, relator da ação, negou indenização a Marcelina Menegazzo de Bastiani, cujo marido morreu em 1997, afirmando que o cigarro é um produto lícito no país.

Propaganda enganosa
Em São Paulo, a Souza Cruz foi condenada a pagar R$ 600 mil por danos morais à ex-fumante Maria Aparecida da Silva, 49, que teve as duas pernas amputadas em 1995 por causa de uma tromboangeíte aguda obliterante -as artérias de suas pernas estavam entupidas.
A juíza Maria Lúcia Ribeiro de Castro Pizzotti Mendes também condenou a empresa a ressarcir todas as despesas médicas, cirúrgicas, com medicamentos e próteses. A Souza Cruz terá de pagar "lucros cessantes", ou seja, salários que Aparecida da Silva deixou de receber desde 1995. A Adesf (Associação em Defesa da Saúde dos Fumantes), que assessora as duas ações, estima que a indenização supere R$ 1 milhão.
Aparecida da Silva era vendedora e ganhava, segundo ela, uma média de seis salários mínimos por mês -R$ 1.440. Só os salários dela entre junho de 1995 e maio deste ano somam cerca de R$ 154 mil, sem correção monetária.
"Isso é a redenção da minha vida. Tenho certeza de que vou ganhar em todas as instâncias", diz.
A juíza escreveu na sentença que o "dever de indenizar surge da classificação que faço da propaganda do cigarro veiculada pela ré (...) como sendo propaganda enganosa e abusiva".
Ela descreve a opinião de perito de que "a nicotina causa aumento da viscosidade sangüínea (...), facilitando a formação de trombos" [coágulos sangüíneos].
Na sentença, a juíza conclui: "Assim, é inegável que o fumo complicou, em muito, a condição vascular da autora, forçando mais uma vez o nexo causal existente entre o ato de fumar e a doença que lhe levara à amputação dos membros inferiores".


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