São Paulo, terça-feira, 09 de novembro de 2010

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ANÁLISE

Discussão sobre Enem é mais ampla que o erro no exame

PEDRO FLEXA RIBEIRO
ESPECIAL PARA A FOLHA

As trapalhadas na aplicação das provas prejudicam candidatos e abalam a credibilidade da avaliação. São decorrência direta e sintoma do gigantismo a que o Enem foi conduzido. No entanto, por maiores que sejam os transtornos, as controvérsias em torno desse exame ultrapassam -e antecedem- os tropeços operacionais.
O sentido maior de todo o investimento feito pelo governo no Enem deve ser também o de melhorar a qualidade da sala de aula e das práticas docentes. Ele deveria apontar caminhos, induzir inflexões e orientar o sistema de ensino como um todo. Para isso, o governo deveria garantir que, em todo o país, professores do ensino médio recebessem relatórios detalhados do desempenho de seus alunos em cada prova e em cada competência.
No entanto, desde 2007, só o que se tem tido é a divulgação de rankings de efeito sensacionalista, que apenas semeiam desconfiança em relação ao sistema de ensino brasileiro, sem indicar caminhos para aperfeiçoamentos. Ao negligenciar esse aspecto, o governo permite que se escoe um dos principais sentidos do investimento feito em uma avaliação tão dispendiosa.
De outro lado, é oportuno também que se reflita acerca dos usos e sentidos do próprio exame. Com o Sisu, o governo incorporou parte do processo de ingresso nas universidades públicas. O Enem pretende aglutinar diferentes objetivos: avaliar o desempenho individual do estudante, produzir avaliações da qualidade, relevância ou mérito de instituições de ensino e ainda selecionar candidatos ao ingresso na universidade.
No entanto, esses objetivos são distintos, têm sentidos e lógicas diferentes. A tentativa de síntese e reunião desses objetivos em um único exame implica perda de foco e de precisão da avaliação feita, abalando sua precisão e confiabilidade.
Resta a reflexão sobre os motivos de o governo querer controlar diretamente critérios para acesso às universidades públicas e converter o Enem em um gigantesco vestibular de Estado. Essa investida centralizadora expõe o mesmo espírito de tutela inspirador dos mecanismos de "controle social da imprensa". Ou daqueles que despendem energia patrulhando obras de Monteiro Lobato.


PEDRO FLEXA RIBEIRO é educador e diretor do Colégio Andrews, no Rio


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