São Paulo, quinta-feira, 09 de dezembro de 2004

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"Eu não me arrependo"

FERNANDA MENA
DA REPORTAGEM LOCAL

Um acidente com o preservativo, dois dias de atraso num ciclo menstrual "reguladinho" e a suspeita se tornou aflitiva demais para esperar. No banheiro de casa, a produtora Maria (nome fictício), 28, mergulhou a haste de papelão de teste de gravidez em sua urina e, ao surgirem duas linhas paralelas no marcador, o que mais temia se confirmara: estava grávida.
Maria nem era tão novinha -estava com 24 anos-, mas, segundo ela, não tinha "a menor estrutura financeira e psicológica para colocar um filho no mundo".
"Junto com a suspeita já veio a certeza de que, se estivesse grávida, faria um aborto", admite.
Leia, a seguir, trechos de seu depoimento à Folha.
 

Folha - Como você descobriu a gravidez e optou pelo aborto?
Maria -
Foi tudo junto. Se ainda hoje eu não tenho nenhuma estrutura para ter um filho, imagine há quatro anos. Precisava de mais maturidade e dinheiro.

Folha - Mas, para evitar uma gravidez, também há meios.
Maria -
Admito que tem toda essa questão da prevenção. No meu caso, foi acidente. A camisinha estourou. Aconteceu, e o aborto foi a melhor opção para mim.

Folha - Você, na época, sabia que aborto é crime?
Maria -
Sabia de tudo. Mas não concordo com isso. A mulher tem de ter uma opção. Não acho que aborto tem de ser usado como método contraceptivo, ou seja, engravidou, faz. Só que há casos e casos, e isso deve ser respeitado.

Folha - Como fez o aborto?
Maria -
No mesmo dia do resultado positivo do exame, saí procurando um meio de fazer o aborto. Queria fazê-lo o quanto antes, para que o feto não estivesse formado ainda. Tinha uma amiga que já tinha feito, e ela me indicou o médico que havia cuidado do caso dela. Fiz o aborto em um hospital-maternidade, com toda a estrutura. Paguei, na época, R$ 1.000 por ele. Acordei da anestesia com cólicas e uma sensação esquisita. Não sou um monstro, mas sabia o que tinha de fazer naquele caso. E não me arrependo nem um pouco disso.

Folha - Por que você acha que há quem seja contra o aborto?
Maria -
Há os preconceitos e os preceitos religiosos. Mas abortos sempre serão feitos. É algo que, apesar de qualquer lei, sempre vai existir. E eu acho que é melhor que sejam evitados problemas mais graves de saúde e até mortes de mulheres por conta de remédios e clínicas de fundo de quintal.


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