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PASQUALE CIPRO NETO
Correção e coerência
Na última prova da Fuvest, realizada em 28 de novembro, os candidatos tiveram de
responder a um teste baseado
nestas três frases: "I. O autor do
texto assistiu ao filme sobre Cazuza. II. O filme provocou-lhe uma
viva e complexa reação. III. Sua
reação mereceu uma análise". A
questão pedia ao candidato que
apontasse a alternativa em que as
frases estivessem "articuladas de
modo correto e coerente".
As opções eram estas: "a) Tendo
assistido ao filme sobre Cazuza,
este provocou o autor do texto numa reação tão viva e complexa
que lhe mereceu uma análise; b)
Mereceu uma análise, a viva e
complexa reação, provocadas pelo filme que o autor do texto assistiu sobre Cazuza; c) A reação que
provocou no autor do texto o filme sobre Cazuza foi tão viva e
complexa que mereceu uma análise; d) Foi viva e complexa a reação, que aliás mereceu uma análise, provocado pelo filme sobre
Cazuza, que o autor assistiu; e) O
filme sobre Cazuza que foi assistido pelo autor provocou-lhe uma
reação viva e complexa, que a sua
análise foi merecida".
O enunciado da questão fala
em articulação correta e coerente,
o que pressupõe respeito à norma
culta da língua e emprego adequado dos elementos lingüísticos
que estabelecem o nexo textual.
Comecemos pelo segundo item
(o nexo). Que relação se pode estabelecer entre a reação que o filme provocou no autor do texto e o
fato de essa reação ter sido merecedora de uma análise? A análise
certamente decorreu da reação,
portanto a relação é de causa e
efeito, causa e conseqüência.
E quais são os elementos lingüísticos com que se pode estabelecer essa relação? Pensemos num
caso bem simples: chuva forte e
alagamento. Reflita sobre estas
duas frases: "As ruas ficaram alagadas porque a chuva foi muito
forte"; "A chuva foi tão forte que
as ruas ficaram alagadas".
Embora tenham sido estruturadas de maneiras diferentes, as
duas frases estabelecem entre a
chuva e o alagamento das ruas a
mesma relação: a chuva é causa;
o alagamento, conseqüência.
Na primeira frase, empregou-se
a conjunção "porque", clássica
introdutora do nexo de causa. Na
segunda frase, nota-se a seqüência "...tão forte que...", típica dos
enunciados em que a oração que
começa no "que" ("que as ruas ficaram alagadas", no caso) apresenta a conseqüência do que foi
exposto na oração anterior.
Vamos voltar à questão da Fuvest. Se levasse em conta o nexo, o
candidato poderia rapidamente
pensar nas duas clássicas estruturas de causa e conseqüência (que
acabamos de ver), as quais, grosso
modo, poderiam ser apresentadas
assim: a) "Por ter sido tão viva e
complexa (= "Porque foi tão viva
e complexa'), a reação que o filme
provocou no autor do texto mereceu uma análise"; b) "A reação
que o filme provocou no autor do
texto foi tão viva e complexa que
mereceu uma análise".
Com o procedimento sugerido,
uma rápida vista d'olhos bastaria
para o aluno escolher a opção "c"
(a única em que o nexo é estabelecido adequadamente): "A reação
(...) foi tão viva e complexa que
mereceu uma análise".
Não se pode esquecer que a banca exige também correção. Na opção "b", por exemplo, a vírgula
que vem depois de "análise"
("Mereceu uma análise, a viva e
complexa reação...") separa o predicado do sujeito, o que basta para que essa alternativa seja imediatamente descartada. É isso.
Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna às quintas-feiras
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