São Paulo, domingo, 09 de dezembro de 2007

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Governador Valadares ainda tenta se adaptar

Cidade mineira, símbolo da imigração brasileira para os EUA, teme fuga de dólar

Entrada mensal de dólares é estimada em US$ 5 mi; para gerente de Caixa Econômica Federal, comércio já sente queda da moeda circulante

Alan Marques - 6.dez.07/Folha Imagem
Entre filhos, Luciana Ferreira da Macena, que trabalhou até outubro nos EUA e voltou ao Brasil


PAULO PEIXOTO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM GOVERNADOR VALADARES

Município que se tornou símbolo da imigração brasileira para os EUA, Governador Valadares tenta se adaptar ao movimento migratório inverso.
Como a cidade-pólo do leste mineiro não tem indústrias, e seu comércio é muito dependente dos dólares enviados pelos imigrantes aos parentes, políticos, empresários e ONGs, teme-se que a volta dos brasileiros que se aventuraram nos EUA crie um novo problema social em Valadares, que já foi apelidada de "Valadólares".
"A sociedade não se preparou para isso. Não temos proposta de desenvolvimento. O projeto aqui sempre foi imigrar. O comércio local sempre se deu bem e todos se acomodaram", disse Antônio Carlos Linhares Borges, coordenador do Ciaat (um centro de amparo ao imigrante e à sua família).
A entrada mensal de dólar na cidade é estimada em cerca de US$ 5 milhões. O valor anual de US$ 60 milhões que incrementa o comércio representa 23% do orçamento municipal.
Segundo o gerente Regional da CEF (Caixa Econômica Federal), José Geraldo Sales, já há registro oficial de queda 6% no montante das remessas nos meses de setembro, outubro e novembro em comparação com o mesmo período de 2006.
"O comércio já sente muito a queda do dólar em circulação", disse Sales, ao acrescentar que o setor que mais sofre o efeito é o de material de construção.
As estimativas feitas na cidade de 260 mil habitantes são que 16% da população (41 mil pessoas) vive nos EUA, quase todos na clandestinidade.
Com a volta de parte dessas pessoas, a preocupação é oferecer oportunidade para que elas conheçam um pouco de empreendedorismo. Segundo pesquisa do Ciaat, 72% dos que abrem um negócio quando voltam fecham o empreendimento em até dois anos e perdem o dinheiro que conseguiram. O Sebrae, com recursos do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e da CEF, promoveu na semana passada um programa piloto nesse sentido.

Crise
Depois de viver em Nova York como motorista e na Flórida trabalhando na área da construção civil, a "realidade" mostrou a Mabley Domingos, 32, que era hora de refazer as malas e voltar para Itabirinha de Mantena, cidade de 10.338 habitantes a 110 km de Governador Valadares.
Foram 12 anos e três meses distante da terra natal, e agora são cinco meses de volta, se preparando para virar empresário. "Eu não pensava em voltar agora, mas o trabalho [nos EUA] está só caindo. A questão econômica pesou, o trabalho já estava ruim e a Prefeitura de Itabirinha queria que as pessoas voltassem para montar um negócio."
Domingos pretende abrir um posto de gasolina na cidade mineira, que tinha na sua frota no ano passado 626 automóveis, 43 camionetes e 1.052 motocicletas, segundo o IBGE.

Garçon
Numa churrascaria de Valadares, o garçom Paulo Ferreira da Silva, 45, voltou em janeiro, após um ano e sete meses trabalhando como pintor na Flórida, situação interrompida pelo estado de depressão da sua mulher, que havia ficado no Brasil. Ele não pensa em voltar.
A família é um dos motivos que levam os brasileiros a abandonarem o sonho americano. Mas outros dois fatores, conforme os relatos ouvidos pela reportagem, também são determinantes: o maior rigor na fiscalização aos clandestinos e a questão econômica, especialmente para quem trabalhava na construção civil.
"Eu era pintor, tinha trabalho sempre, desde que cheguei lá, em 2004. Essa bolha imobiliária dificultou tudo e tive que voltar. Ficou mais difícil conseguir trabalho", disse Alex Robson Souza, 29, que retornou ao Brasil em março.


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