São Paulo, domingo, 09 de dezembro de 2007

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"Brasileiros são prisioneiros do limbo"

Para a brasilianista Maxine Margolis, endurecimento de leis pós-11 de Setembro empurrou imigrantes para a ilegalidade

Na opinião da autora, da Universidade da Flórida, os imigrantes que já estão nos Estados Unidos se sentem obrigados a ficar no país

SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON

Nem todos concordam que há um êxodo brasileiro tomando lugar nos EUA. Para a brasilianista Maxine Margolis, da Universidade da Flórida, é o contrário: com o recrudescimento das leis e da atitude antiimigração no país, a parcela ilegal dos brasileiros aqui está se movimentando menos e se escondendo mais. Viraram o que ela chama de "prisioneiros do limbo".
O status é um efeito colateral do endurecimento das leis antiimigração e de sua aplicação no pós-11 de Setembro, segundo disse à Folha por telefone. Autora de dois livros sobre imigrantes brasileiros, ela publica em janeiro estudo sobre a ida involuntária desses brasileiros para o "limbo". Leia a seguir:

FOLHA - A sra. estuda o que chama de brasileiros "aprisionados no limbo". O que é isso?
MAXINE MARGOLIS
- Há três grupos de imigrantes brasileiros nos EUA. O primeiro é de gente que chegou depois do 11 de Setembro, entrou no país pelo México e vem de lugares até então incomuns de emigração.
Há um grande grupo, por exemplo, do Acre e de Rondônia na Flórida e em Nova Jersey. Eles são na maioria das vezes operários, trabalhadores braçais, e sabem que, se conseguirem entrar, vão ficar dois ou três anos, fazer um pé de meia, sair e nunca mais voltar.
O segundo grupo é formado por brasileiros que vivem aqui há 15 anos, têm greencard, são legalizados, aprenderam o inglês e basicamente podem ir e vir quando quiserem. Muitos se tornam cidadãos.
O povo do "limbo" é o que está entre os dois grupos. Eles estão aqui há oito anos, dez anos, 12 anos, podem ter filhos americanos, podem ter comprado casa e ter um bom emprego ou até um pequeno negócio. E eles não podem arriscar ir para o Brasil e perder o que têm aqui.
Mesmo que queiram ir a um casamento ou ver os pais doentes, não viajam porque sabem que há risco real de não conseguirem voltar, e aqui é o lugar onde eles querem morar até se aposentar. E eles podem muito bem ser presos na fronteira ou no aeroporto e acabar deportados. Estão "presos no limbo".

FOLHA - A sra. diz que é um efeito colateral do 11 de Setembro. Como resolvê-lo?
MARGOLIS
- A solução é não contratar essas pessoas. A única maneira de acabar com a imigração ilegal é não dar empregos a essas pessoas. Enquanto houver demanda por trabalhadores que ganham pouco, vai ter gente entrando ilegalmente. Mas o mais grave sobre a dificuldade de entrar no país ou de conseguir visto de turista são as conseqüências que afetam os que já moram aqui -eles estão se sentindo obrigados a ficar.
Em vez de pegar suas coisas e ir embora, como os políticos esperam que aconteça quando passam leis antiimigração, os imigrantes sem documentação estão encalhados. Costumavam poder ir e vir, mas agora não podem ir embora sem arriscar perder o que conquistaram. Acabam ficando nos EUA muito mais do que gostariam.

FOLHA - Uma outra conseqüência imprevista é empurrar essas pessoas ainda mais para a marginalidade, não?
MARGOLIS
- Claro! Sinto que os brasileiros mudaram muito em relação a mim, por exemplo. Quando estava fazendo pesquisa em Nova York nos anos 90, só dois brasileiros não quiseram falar comigo por medo, ante centenas que deram longas entrevistas, me mostraram suas casas, trabalhos. Agora, quando os encontro, eles têm medo. É terrível.

FOLHA - Como a sra. avalia o caso de Riverside [em Nova Jersey, em que a aprovação de legislação antiimigrantes afugentou a comunidade de brasileiros, o que causou um grande prejuízo econômico à cidade, que teve de revogar as leis]?
MARGOLIS
- É um desses casos que fez o dia daquele homem repugnante, o Lou Dobbs [apresentador conservador da CNN]. Começou com uma série de reportagens, há um ou dois anos. Terminou com passeatas e grande movimentação antiimigrantes. É horrível.
Sei que a cidade tem um índice alto de desemprego, já foi uma zona industrial e recebeu uma onda de brasileiros. Mas norte-americanos com pouca educação têm dificuldade em arrumar bons empregos e facilidade em culpar os imigrantes por isso. E pessoas como o Lou Dobbs são especialistas em botar lenha nessa fogueira.

FOLHA - A sra. acha que vamos ver mais casos assim?
MARGOLIS
- É possível, não sei dizer. Espero que outras cidades pensem duas vezes antes de passar essas leis que assustam os imigrantes. Porque, quando eles vão embora, o problema é muito mais grave do que quando eles chegam.


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