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"Brasileiros são prisioneiros do limbo"
Para a brasilianista Maxine Margolis, endurecimento de leis pós-11 de Setembro empurrou imigrantes para a ilegalidade
Na opinião da autora, da
Universidade da Flórida, os
imigrantes que já estão nos
Estados Unidos se sentem
obrigados a ficar no país
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Nem todos concordam que
há um êxodo brasileiro tomando lugar nos EUA. Para a brasilianista Maxine Margolis, da
Universidade da Flórida, é o
contrário: com o recrudescimento das leis e da atitude antiimigração no país, a parcela
ilegal dos brasileiros aqui está
se movimentando menos e se
escondendo mais. Viraram o
que ela chama de "prisioneiros
do limbo".
O status é um efeito colateral
do endurecimento das leis antiimigração e de sua aplicação
no pós-11 de Setembro, segundo disse à Folha por telefone.
Autora de dois livros sobre imigrantes brasileiros, ela publica
em janeiro estudo sobre a ida
involuntária desses brasileiros
para o "limbo". Leia a seguir:
FOLHA - A sra. estuda o que chama
de brasileiros "aprisionados no limbo". O que é isso?
MAXINE MARGOLIS - Há três grupos de imigrantes brasileiros
nos EUA. O primeiro é de gente
que chegou depois do 11 de Setembro, entrou no país pelo
México e vem de lugares até
então incomuns de emigração.
Há um grande grupo, por
exemplo, do Acre e de Rondônia na Flórida e em Nova Jersey. Eles são na maioria das vezes operários, trabalhadores braçais, e sabem que, se conseguirem entrar, vão ficar dois ou
três anos, fazer um pé de meia,
sair e nunca mais voltar.
O segundo grupo é formado
por brasileiros que vivem aqui
há 15 anos, têm greencard, são
legalizados, aprenderam o inglês e basicamente podem ir e
vir quando quiserem. Muitos
se tornam cidadãos.
O povo do "limbo" é o que está entre os dois grupos. Eles estão aqui há oito anos, dez anos,
12 anos, podem ter filhos americanos, podem ter comprado
casa e ter um bom emprego ou
até um pequeno negócio. E eles
não podem arriscar ir para o
Brasil e perder o que têm aqui.
Mesmo que queiram ir a um
casamento ou ver os pais doentes, não viajam porque sabem
que há risco real de não conseguirem voltar, e aqui é o lugar
onde eles querem morar até se
aposentar. E eles podem muito
bem ser presos na fronteira ou
no aeroporto e acabar deportados. Estão "presos no limbo".
FOLHA - A sra. diz que é um efeito
colateral do 11 de Setembro. Como
resolvê-lo?
MARGOLIS - A solução é não
contratar essas pessoas. A única maneira de acabar com a
imigração ilegal é não dar empregos a essas pessoas. Enquanto houver demanda por
trabalhadores que ganham
pouco, vai ter gente entrando
ilegalmente. Mas o mais grave
sobre a dificuldade de entrar no
país ou de conseguir visto de
turista são as conseqüências
que afetam os que já moram
aqui -eles estão se sentindo
obrigados a ficar.
Em vez de pegar suas coisas e
ir embora, como os políticos esperam que aconteça quando
passam leis antiimigração, os
imigrantes sem documentação
estão encalhados. Costumavam poder ir e vir, mas agora
não podem ir embora sem arriscar perder o que conquistaram. Acabam ficando nos EUA
muito mais do que gostariam.
FOLHA - Uma outra conseqüência imprevista é empurrar essas pessoas ainda mais para a marginalidade, não?
MARGOLIS - Claro! Sinto que os
brasileiros mudaram muito em
relação a mim, por exemplo.
Quando estava fazendo pesquisa em Nova York nos anos 90,
só dois brasileiros não quiseram falar comigo por medo, ante centenas que deram longas
entrevistas, me mostraram
suas casas, trabalhos. Agora,
quando os encontro, eles têm
medo. É terrível.
FOLHA - Como a sra. avalia o caso
de Riverside [em Nova Jersey, em
que a aprovação de legislação antiimigrantes afugentou a comunidade
de brasileiros, o que causou um
grande prejuízo econômico à cidade, que teve de revogar as leis]?
MARGOLIS - É um desses casos
que fez o dia daquele homem
repugnante, o Lou Dobbs
[apresentador conservador da
CNN]. Começou com uma série
de reportagens, há um ou dois
anos. Terminou com passeatas
e grande movimentação antiimigrantes. É horrível.
Sei que a cidade tem um índice alto de desemprego, já foi
uma zona industrial e recebeu
uma onda de brasileiros. Mas
norte-americanos com pouca
educação têm dificuldade em
arrumar bons empregos e facilidade em culpar os imigrantes
por isso. E pessoas como o Lou
Dobbs são especialistas em botar lenha nessa fogueira.
FOLHA - A sra. acha que vamos ver
mais casos assim?
MARGOLIS - É possível, não sei
dizer. Espero que outras cidades pensem duas vezes antes de
passar essas leis que assustam
os imigrantes. Porque, quando
eles vão embora, o problema é
muito mais grave do que quando eles chegam.
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