São Paulo, sábado, 10 de março de 2001

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LETRAS JURÍDICAS

Direitos e deveres dos presos

WALTER CENEVIVA
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O s presos de todos os matizes (condenados, sujeitos à prisão em flagrante, preventiva, administrativa, civil) têm direitos e deveres. A Carta Magna brasileira -no limite de meu conhecimento- inclui o maior número de disposições em favor do prisioneiro, desde a regra que lhe assegura o respeito à integridade física e moral (artigo 5º, inciso XLIX). Tratando-se de ordenamento incluído no rol dos direitos fundamentais, nas chamadas cláusulas pétreas, hão de ser cumpridas estritamente como nelas está contido.
Antes de criticar tais normas, lembre-se que a Constituição resulta do trabalho de representantes do povo. Espelha o pensamento médio de todos os cidadãos brasileiros, muito embora boa parte das normas constitucionais e das leis ordinárias a respeito seja incompatível com nossas condições econômicas e sociais. Assinalam programas para o futuro, sendo, por isso mesmo, chamadas de programáticas. Serve de exemplo, no artigo 5º, o inciso XLVIII da Constituição (a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado). Trata-se, em tese, de norma excelente, que, na prática, é desrespeitada.
Há, porém, disposições constitucionais compatíveis com o interesse social e bem implementadas. Dou exemplos. Nenhuma pena passa da pessoa do condenado. Em certos casos, o delinquente pode ser obrigado a reparar o dano. Em outros, a Justiça pode condená-lo a perder bens, em consequência estendida aos seus herdeiros e sucessores, até o valor do patrimônio transferido criminosamente para esses, conforme o Ministério Público vem propondo quanto aos líderes do PCC. Há outras que não funcionam, como a que proíbe penas cruéis, seja lá o que se considere crueldade punitiva. Na prática, recolher dezenas de acusados, mesmo antes da condenação, numa cela em que só há espaço para poucas pessoas é cruel em si mesmo. Além disso, incentiva geométrico crescimento da criminalidade violenta.
Os incisos LXI a LXVI do artigo 5º da Constituição de 1998 incluem no rol dos direitos individuais a obrigatoriedade da comunicação imediata da prisão ao juiz competente e à família do preso; a informação dos direitos dele, inclusive o de permanecer calado, a preferência pela liberdade provisória, permitida em lei. Vozes frequentes na sociedade queixam-se de que os criminosos estão tendo mais direitos do que os cidadãos prestantes. Lembrando a conduta do PCC, basta ler o artigo 39 da Lei de Execução Penal, o qual inclui entre os deveres, que o preso não respeita, o comportamento disciplinado, a obediência ao servidor, a não-participação em movimento coletivo, a higiene pessoal e o asseio na cela. Essa lei garante ao recolhido à penitenciária (artigo 88) cela individual de área mínima de 6 metros quadrados com dormitório, aparelho sanitário e lavatório provida de salubridade, aeração, insolação e condicionamento térmico.
Numa sociedade em que muitos seres humanos livres e trabalhadores sofrem com suas famílias condições difíceis de vida, a aceitação dessa gama de direitos gera críticas violentas. Apesar delas, compreensíveis mas não-científicas, a experiência mostra que o tratamento desumano dos prisioneiros estimula a criminalidade. Gera novos delinquentes. Prejudica todo o corpo social. Piora tudo, mas não a ponto de sugerir a substituição da autoridade da administração pública pela "autoridade" de delinquentes que trombam frontalmente com a ordem pública, enfraquecendo-a. Isso não.



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