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FÍGADO
Paul McMaster esteve em evento
Campanha é saída para aumentar as doações
EDMILSON ZANETTI
DA AGÊNCIA FOLHA, EM SÃO JOSÉ DO RIO PRETO
O Brasil só vai aumentar o número de doadores de órgãos por
meio de campanhas, especialmente as feitas pelas igrejas. A
opinião é do cirurgião britânico
Paul McMaster, 57, um dos maiores especialistas do mundo em
doenças do fígado.
Ele chefia a unidade de fígado e
vias biliares do Queen Elizabeth
Hospital, uma das referências
mundiais no assunto. Sua equipe
já realizou mais de 2.000 transplantes em 20 anos. O número é
quase quatro vezes o que o Brasil
realiza por ano. No Brasil, 3.400
pessoas engrossam a fila de espera para um transplante a cada
ano, mas só 600 conseguem. Cerca de 30% morrem na fila.
McMaster anuncia que, em 20
anos, será possível transplantar
órgãos de animais geneticamente
mudados para seres humanos.
O cirurgião foi um dos convidados do 1º Simpósio Internacional
sobre Doenças Hepáticas e Transplante de Fígado do Oeste Paulista, que reuniu de quarta-feira até
ontem, em São José do Rio Preto
(440 km a noroeste de São Paulo),
especialistas do Brasil, Inglaterra,
Japão, Turquia, Chile e Grécia.
Leia a seguir os principais trechos
da entrevista.
Agência Folha - O que é possível
fazer para aumentar o número de
doadores de órgãos no Brasil, especificamente de fígado?
Paul McMaster - A taxa de doadores no Brasil é uma das menores do mundo. As pessoas não entendem que, se alguém morrer, é
uma oportunidade única de ajudar alguém que está doente.
Agência Folha - O que é preciso
para mudar essa mentalidade?
McMaster - Campanhas. O
transplante só pode ser feito com
apoio da comunidade. O que conta é a vontade de ajudar. As campanhas das igrejas no mundo inteiro fazem a diferença.
Agência Folha - Como poderiam
ser essas campanhas?
McMaster - Na Inglaterra, líderes
das igrejas são encorajados a incentivar as pessoas a participar.
Agência Folha - O que a medicina
prepara para diminuir a necessidade de transplante de fígado?
McMaster - Tentamos prevenir
as pessoas para que não fiquem
doentes. Uma das principais causas é o álcool.
Agência Folha - Que outros cuidados devem ser tomados?
McMaster - Controlar a hepatite
B e a hepatite C. O governo tem
um programa de vacinação para
bebês, contra hepatite B, mas para
hepatite C não tem vacina. Ela é
epidêmica e está se espalhando
pela América do Sul.
Agência Folha - Alguns médicos
defendem que, mesmo que se captem todos os órgãos disponíveis,
ainda assim o número será insuficiente para atender as necessidades de transplante. Qual a perspectiva de a medicina utilizar órgãos
de animais em seres humanos?
McMaster - O ideal seria o transplante de órgãos de animais, mas
é alto o risco de infecção. Mas isso
será possível daqui a 20 anos. Na
Primeira Guerra Mundial, 9 milhões de pessoas morreram. Em
1995, 13 milhões de pessoas morreram por causa de vírus, que podem ter vindo de animais.
Agência Folha - Seriam animais
geneticamente modificados?
McMaster - Sim. Eles vão mudar
geneticamente para evitar rejeição. É nisso que estamos trabalhando hoje.
Agência Folha - Poderia ser a solução definitiva?
McMaster - Talvez, mas as chances de sucesso hoje são relativamente pequenas.
Agência Folha - Existe idade limite para ser doador ou receptor de
fígado?
McMaster - Não. Desde um bebê
com 2 kg até alguém de 75 anos.
Agência Folha - Quais os resultados dos transplantes de fígado?
McMaster - No meu país, 75% vivem bem pelo menos cinco anos.
Alguns são mais saudáveis que os
médicos.
Agência Folha - No caso de doador vivo, quais são os riscos para
quem doa?
McMaster - Na Inglaterra não fazemos transplante entre vivos.
Temos um programa ativo de
transplante com cadáveres. Em
muitos países essa técnica está
sendo desenvolvida. Um risco são
as infecções. O outro, muito pequeno, é o doador morrer.
Agência Folha - Existem números
de mortes?
McMaster Cinco mortes em todo
o mundo, em 2.000 transplantes
inter vivos. O Brasil tem altos índices de acidente de trânsito e de
violência. Existe, portanto, um
grande número de doadores em
potencial. Se todo mundo trabalhasse junto, haveria um número
suficiente de doadores. Tem lugar
em que se divide o fígado em dois.
Isso não acontece no Brasil. Os
colegas brasileiros acham que vai
aumentar o transplante inter vivos, mas eu acho que é esse, de cadáver, dividindo o fígado em dois,
que vai aumentar.
Agência Folha - Se não existe
consciência coletiva de doação no
Brasil, o transplante inter vivos
não seria uma saída para diminuir
a fila de espera?
McMaster - Eu espero que aumente primeiro o transplante
com mortos.
Agência Folha - O senhor vê falhas na captação no Brasil?
McMaster - Poderia ser melhor.
Por que o Brasil tem o melhor time de futebol? Porque são jogadores bons individualmente e se
juntam em equipe. No Brasil existem excelentes unidades de transplantes, mas deveriam trabalhar
como um time.
Agência Folha - Quanto anos pode viver uma pessoa que recebeu
um fígado de outra?
McMaster - Começamos nosso
programa em 1981. Três dos cinco
transplantes que fizemos naquele
ano estão bem até hoje. O problema são os três primeiros meses.
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